Conheci Renata cerca
de onze anos atrás, quando ela esmolava na porta de uma Igreja.
Dois filhos do lado.
Igual cadela jogada
para fora de casa num dia de chuva.
Marido largara
Renata. Também, homem gosta mesmo é de receber, não de recompensar. Tosse
comprida. Anemia profunda.Despejo.Prostração.
Sem ter mais onde
colocar a bunda, sem espelho, sem colchão, sem futuro, sem marido. Só Renata.
Renata da porta da Igreja. Renata do banco da praça. Renata vira-latas.
Cachorra Renata.
Até o vigário da
paróquia fugia dela. As doações dos fiéis estavam parcas, minguadas. E a gente
da cidade era muito faladeira. Poderia ser expulso. Seria suicídio. O que faria
depois? Onde encontrar tanta mordomia? Ter que pagar aluguel, viver de salário,
como gente comum...Ah, não!
Houve um tempo em
que Renata entrou com processo contra o marido que, diziam, estava com um bom cargo
na Prefeitura local. Ação de alimentos. Como no Código. Advogado do Estado.
Fraco, metido a bacana, nem a incentivara a seguir adiante. Pura pornografia. A
Assistência Social tomou-lhe os filhos. Soube mais tarde que haviam morrido.
Nalguma Febem, com certeza. De que? Não disseram.
Coitada! E nem se
chamava Maria.
Ninguém oferecia
trabalho. Também, quem poderia? Só se fosse alguém que lhe desse um banho de
loja, depois de um banho com sabão de cinza e bastante água sanitária.
Mas não é que aquele
português, o Manoel Formiga resolveu apostar na Renata? Empregou-a em sua casa.
Tinha um quartinho nos fundos onde ela poderia morar dormir.
E Renata tornou-se
gente outra vez. Comia no prato. Bebia no copo. Dormia em colchão desses de
mola. Aprendeu a dançar. Sorria para o portuga. Ele cada vez mais gostando do
que via. Resolveu pedir Renata em casamento. Aceitou no ato, a coitada. E foi
um lindo casamento. Regado a vinho do Porto e a música regional.
E resolveram ir
embora para muito longe do passado. De ambos...
Ontem, lendo o
‘Notícias Populares’, deparei-me com a notícia em letras garrafais: ESTUPRADA E MORTA POR DOIS MARGINAIS NA PORTA
DA IGREJA’.
Era Renata. A mesma
Renata. E o crime fora cometido por seus próprios filhos. Que só ficaram
sabendo que era a mãe, na prisão.
Que porcaria de
vida!
Que troça do
destino!
E tem gente que
ainda não acredita em destino.
E tanta Renata
existe por aí que merece castigo maior por tantas malandragens, por tantas
arbitrariedades, por tamanhas involuções na vida das pessoas, logo aquela
Renata é que foi a escolhida para ter um final de novela assim.
Será que em outra
encarnação ela foi algoz, executando a pena de morte como se fizesse justiça
com as próprias mãos?
Que fatalidade!
Pura mamãezada!
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