sábado, 14 de abril de 2012

NO BAIRRO DE CAPÃO RICO LÁ MORAVA O RUFINO MACEDO.

"Chamava-se Rufino Macedo.
Morador no Bairro do Capão Rico, em São Miguel Arcanjo, era lá agricultor e tinha muitas posses.
Na despensa de casa, do piso até o teto, uma sacaria que dava para saciar a fome de todos os soldados da guerra de 32.
No quintal, cabritos, galinhas e porcos passeavam, brigando entre si.
Na invernada, o gado pacientemente engordava.
Rufino, por essas e outras coisas, era um homem brioso e de muita fibra.
Sentia um baita orgulho do próprio nome.
Era comum vê-lo cumprindo promessas em Iguape.
Quando para lá se dirigia, levava sempre a mulher, dona Cecília.
Na volta, era só festa.
Ninguém passava fome estando ao lado de Rufino Macedo.
Como todas as pessoas, ele também tinha seu bicho de estimação.
Era a mula Dengosinha.
Por todo lado, sempre levava a mulinha; não montado nela, mas a sua frente.
Aonde ele precisasse chegar, ela conhecia o caminho e sempre chegava na frente dele.
Um dia de sexta-feira, Rufino precisou comprar querosene para usar na fazenda.
Os lampiões estavam secando e, quando isso acontecia, dona Cecília ficava brava.
A mula na frente, ele atrás, com o Bainho, admirando o horizonte.
Uns dois quilômetros e já estaria na venda do Nhonhô Fogaça.
De repente, não viu mais a mula.
Apressou o cavalo e viu que uma mulher já havia aberto a porteira do Antão Rodrigues para a Dengosinha e corria atrás dela.
Esporeou o cavalo.
Quanto mais ele corria, mais a mulher corria pensando que ele corria atrás dela.
Tanto que denunciou o fato ao Inspetor de Quarteirão que lhe deu um pito tão grande que fez com que o homem se tornasse de novo em um rapazinho.
Uma calúnia!
Uma vergonha!
Nunca mais Rufino Macedo foi o mesmo.
Passava os dias taciturno, macambúzio. Parecia até tecer um plano, ele que nunca foi vingativo.
Os romeiros se aprontando para a caminhada a Iguape.
Rufino também. Só que desta vez não levaria dona Cecília e nem tinha promessas para cumprir.
Diante do santo, orou muito, chorou as mágoas guardadas no peito, pediu perdão pelas coisas que nem fizera na vida.
A certa altura do caminho, entrou na mata para esvaziar as tripas e nunca mais regressou.
Encontraram Rufino morto com o pescoço enleado num cipó.
Deus o tenha, Rufino Macedo!"

- Transcrito do livrete "Causos e Conformes", Editora Trombetti, 2.010, idealização Ascasma, compilado por Luiza Válio.

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