"Em 1.850, ainda não existia estrada de ferro na então Província de São Paulo.
A importação de mercadorias estrangeiras de que carecia o povo paulista e a exportação de suas produções agrícolas, no interior, eram transportadas em lombos de burros.
Havia nesse tempo uma imensidade de tropas que iam e vinham de Santos para as cidades da então Província e desta para aquele porto.
O caminho de Santos, dizem os mais velhos, era um formigueiro: cruzavam-se os lotes de diferentes tropas gemendo com o peso de dois volumosos costados.
Naquele tempo ninguém pensava que o vapor com o seu dorso negro e boca fumegante havia de mais tarde atrever-se a subir a alta muralha do Cubatão, e qual uma gigantesca serpente avançasse até os mais longínquos sertões.
Os ricos daquela época cuidavam da lavoura a esmo.
Embora a indústria fosse ainda muito limitada, alguns entregavam-se ao movimento de transporte, e para isso tinham tantos lotes quantos podiam.
A reunião de todos os lotes de um patrão chamava-se uma tropa.
Em cada tropa haviam um arrieiro, diversos tocadores de lotes e um cozinheiro.
Os patrões de então eram os homens mais desenvolvidos no comércio, e os pobres camaradas sofriam toda casta de imposições para ganhar o negro pão.
Aqui nesta Vila, haviam uns tais Rosa Soares, Tobias e outros que eram tropeiros.
De uma dessas tropas era arrieiro Francisco de Paula Ribeiro e cozinheiro Antonio Dias de Moraes, naquela época menino ainda este último.
Estes sujeitavam-se àquele rigoroso trabalho, ganhando um ordenado mesquinho, sendo ainda aviltados com maus tratamentos.
Coitados!
A necessidade os forçava a esse servilismo pouco digno de que os patrões tiravam grandes resultados.
O primeiro já não existe.
O segundo vive ainda, e não obstante a sua pobreza, os seus filhos honram-se de citar em qualquer lugar os carinhosos nomes de seus pais.
Foram pobres, mas foram honrados, e para seus filhos não há riqueza maior do que essa virtude, que é o apanágio do caráter.
Hoje, os tempos são outros; os filhos dos dois velhos tropeiros vingarão os sofrimentos de seus dignos progenitores, e não se curvarão ante os pseudo-potentados e saberão repelir os mandões e aventureiros hipócritas.
Assim irão dando uma lição de moral, de educação e de patriotismo a esses exóticos letrados que lhes ofuscaram a vista e a consciência indiretamente, mas que eles irão rebatendo diretamente com a força da razão e da verdade.
Vila da Piedade é deles, porque aqui nasceram e amam-na, e não podem ceder a esses disfarçados exóticos.
Piedade, 06 de outubro de 1.901.
a). José Preto."
- Transcrito do extinto jornal "O DEMOCRATA", de Capão Bonito do Paranapanema, edição de 3 de novembro de 1.901, de nosso acervo.
A ilustração é de um mapa da rota dos tropeiros de autoria desconhecida.
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