quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

VALE DO RIBEIRA- UMA TERRA ENCANTADA.




A Lenda do Tesouro Enterrado no Rio Assungui




Uma lenda criada nos sertões do Vale do Ribeira e Juquiá se refere ao tesouro de um padre da Companhia de Jesus chamado Maurício, que no final século XVII e início do século XVIII andava pelas trilhas do Ribeira e Juquiá catequizando índios e, com a ajuda destes, explorando ouro, como o faziam quase todos os padres desta Companhia.

No desenrolar desta história aconteceram fatos que levaram ao entendimento de um fabuloso tesouro em barras de ouro enterrado em um antigo sitio nas proximidades do atual Município de Sete Barras, que teve seu nome inspirado nessa lenda.

Conforme registro de um seu ancestral, Paulo de Castro Laragnoit escreveu em sua obra “Riquezas do Vale da Esperança” que a riqueza amealhada pelo jesuíta Mauricio foi muito bem enterrada na margem de um rio do Vale do Ribeira, chamado de Assungui, no caminho que vai para o Pilar (?), e sua lenda mistura-se ao ouro enterrado e perdido nas proximidades de Sete Barras. 

Entretanto, no decorrer dos anos e séculos, varias expedições foram feitas, na tentativa de se descobrir a enorme riqueza. Todas elas foram fadadas ao fracasso.

Tudo se iniciou no Arraial (Iporanga), quando um espanhol que lá esteve bateando nas guapiaras, obteve sucesso em suas explorações. 

Este estrangeiro conseguiu, após árduo trabalho, juntar muitas pepitas de ouro, perfazendo o total de vários quilos do cobiçado metal. Fundiu-os, então, em sete barras de ouro de grande peso cada uma. 

Resolvendo voltar à sua pátria, levando a preciosa carga, ele descia o Ribeira, em canoa, quando no pouso que fez, no Sitio Goyantãhogoa, soube que havia se instalado um Registro, com um posto para pesagem do ouro, para o pagamento do quinto à Coroa de Portugal.

Resolvido a burlar a Coroa Portuguesa, o espanhol tratou de indagar se poderia chegar a Santos, sem passar pelo Registro. Para obter esta informação, desceu até a Barra do Rio Juquiá, tendo, antes disso, enterrado neste Sitio de Goyantãhogoa, todo o ouro da minas do Arraial, inclusive as sete barras do precioso metal.

Quando o espanhol chegou à Barra do Rio Juquiá, encontrou vários índios apaziguados que, interrogados, lhe disseram que saindo pelo Y-iquiá (Rio Juquiá) e pelo Caynhoiré (Rio São Lourenço) e Itariry, pelas cabeceiras deste último, era muito fácil atingir as praias do mar. 

Estava o espanhol resolvido a fazer a viagem por aquele itinerário e já pensava em voltar ao Sitio Goyantãhogoa, quando um dos índios lhe falou da quantidade de ouro existente no Rio Guyromby (Quilombo), no lugar denominado Rio Tarenconé (Travessão). 

Esta notícia tentou o espanhol para uma nova expedição. 

Sem voltar ao lugar onde enterrara o seu ouro, subiu o espanhol o Rio Quilombo e chegou ao Travessão, onde, sem muito trabalho, tirou grande quantidade de ouro.

Mas, era o espanhol metido a furar sertões, e tendo a notícia das minas ricas de um tal de Pero Vaz, resolveu voltar até as cabeceiras do Rio Assungui e ali entrar de parceria com o dito Pero Vaz. Entretanto, este não consentiu que o espanhol fosse seu sócio naquelas explorações. 

O estrangeiro deixou então o Assungui e voltou ao Sitio Goyantãhogoa para desenterrar o seu ouro. 

Baldados foram os seus esforços; nunca mais conseguiu encontrar o seu precioso enterro.

Depois de muitos dias de procura, sem nada encontrar, desanimado, o espanhol resolveu voltar à pátria, levando consigo o ouro que havia tirado do Travessão, que não era inferior em qualidade e quantidade àquele extraído do Arraial e agora completamente perdido, até alguém, de muita sorte, o encontrasse. 

Com muito pesar, o explorador resolveu abandonar Goyantãhogoa, com a intenção de não pagar o quinto da coroa portuguesa, no Registro. Seguindo pelos Rios Juquiá, São Lourenço e Itariri, chegou ele à Barra do Rio Piguary (Tigre), afluente pela esquerda do Rio Itariri.

Na Barra do Rio Piguary (no local onde hoje de encontra a estação de Pedro de Toledo), encontrou-se o espanhol com um frade conhecido por Frei Maurício, que se fazia acompanhar de muitos índios Cayuás, em viagem de volta para M’Boy, nos arredores de São Paulo. 

Este frade levava para o Convento de M`Boy dez surrões de ouro que extraíra das proximidades da Serra do Itatins. 

O espanhol, sempre tocado pela ambição, sufocou em seu peito a saudade da pátria distante, e, resolvido, foi novamente batear ouro, agora nas Minas de Aranzel. 

Aranzel havia sido um criminoso que se escondera na serra do Itatins e lá descobrira uma fabulosa lagoa, cujas areias continham grande proporção de ouro.

O espanhol seguiu para o Itatins e, como desconhecia aquela região, Frei Maurício destacou um índio para servir-lhe de guia até as cabeceiras do Rio Itaçaenduva, que é atualmente denominado Rio Bananal, com sua barra próxima ao atual Bairro Biguá. 

Para chegarem a esse rio, subiram pelo Rio Piguary (Tigre), galgaram a serra toda e, por um espigão do Itatins, entraram nas águas do Itaçaenduva. Percorrendo as margens de um pequeno córrego, chamado de Itajubá, que quer dizer rio de pedra amarela, eles foram ter a uma lagoa, de bonitas praias. 
As margens dessa lagoa, de difícil acesso, no meio da serra abrupta, estavam cheias de ouro, bastando, para extraí-lo, juntá-los com as mãos, sem auxílio de ferramenta nenhuma.

Desta maneira, foi fácil para o afortunado espanhol extrair ali muito ouro, que guardou em surrões de couro de anta e em canudos de taquarussú. Resolveu, então, seguir dali para Santos, a fim de tomar uma embarcação que o levasse de volta à Espanha, sua terra natal. Deixando as vertentes do Rio Itaçaenduva, procurou as vertentes do Rio N’daipiahy (Despraiado), para, descendo por este e passando pelo Igarapé Quarahú (Canal do Carvalho), ir pelo Rio Una do Prelado até a praia de Una e dali, passando o Rio Guarahú e outros, atingir Santos.

No Rio Itingussú construiu uma canoa e com ela começou a viagem para regressar à pátria. 

Na segunda noite, pernoitou no Porto de Una e, já de madrugada, sobreveio um grande temporal, com tal violência que a canoa se desgarrou do amarro e, ao largo do rio, afundou, levando consigo todo o ouro do aventureiro espanhol. No dia seguinte a canoa foi encontrada de fundo para o céu, mas do precioso carregamento nem sequer encontraram qualquer indício de pó. O fundo lodoso do Rio Una do Prelado guardou para sempre o cobiçado tesouro do mal-aventurado espanhol.

O estrangeiro, sabendo que havia perdido tudo que amealhara com o seu árduo trabalho, enlouqueceu e desapareceu em direção às cabeceiras do Rio Itaçaenduva, novamente em busca das Minas de Aranzel. Tempos depois, foi encontrado pelo Padre Maurício, à margem daquela “Lagoa Dourada”, um esqueleto encostado em uma grande pedra, tendo, nas mãos descarnadas, grandes pepitas de ouro. Era o esqueleto do espanhol! E, desde então, estranhos rumores, formas esquisitas, vozes, lamentações e gemidos são ouvidos por todo aquele que se atreve a demandar a cabeceira do Rio Itaçaenduva.


Diz a lenda, que o espanhol continua a procurar ouro em todos aqueles rios!

Nessa lenda podemos também observar que um velho índio do Rio Piguary, que é afluente do Itariri, informa que o padre Mauricio estava sempre em contato com o espanhol avarento: na Barra do Rio Piguary (Tigre); cedendo um guia índio para que subissem o Rio Itaçaenduva (Bananal) e, finalmente, quando encontrou o esqueleto do espanhol no Itatins.

Toda a lenda se desenrola com os dois personagens sempre às voltas com o Vale do Juquiá. Além disso, já que nos referimos a um caso com fortes tendências lendárias vamos dar asas para a imaginação, pois esta lenda não foi acompanhada por versões sobre a idoneidade do Padre Maurício, da Companhia de Jesus. Esta Companhia era formada por jovens, em sua maioria, mas existiam entre eles alguns homens, já de certa idade, que orientavam os mais novos e que traziam uma vontade imensa e inquebrantável de catequizar os indígenas dos sertões por onde andavam. O gentio era considerado pagão e sem alma, e que deviam ser evangelizados.

Exemplo maior foi o Padre José de Anchieta; conhecido pelo “Poema à Virgem”, rabiscado por ele, com um pedaço de galho, nas areias de uma praia paulista, e que, há muitos e muitos anos, andara pela região, com a louvável missão de levar ao gentio as palavras de Deus, ao mesmo tempo em que ministrava ensinamentos medicinais e iniciava a indiarada, ainda pequena, nas primeiras letras, para que pudessem ler as Sagradas Escrituras e, assim, futuramente, espalhar entre os seus a Palavras do Senhor. Alguns destes padres pagaram com a própria vida o preço de sua extrema solidariedade.

Houve até um padre, de nome Sardinha, que havia sido devorado pelos índios antropófagos do litoral norte paulista. Existira um outro padre, de nome Leonardo, que acabou fundando um convento em Peruíbe, que por ora se encontra em ruínas, e era chamado pelos indígenas de “Abarebebê”, que significa padre voador, pois tamanha era a sua rapidez e facilidade de locomoção pelo meio dos sertões em visita a povoados e aldeias. Mas, entre esses mártires que vestiam surradas batinas, e que serviam à Companhia de Jesus, também existia, como em todas as instituições religiosas, gente esperta, sem escrúpulo e cheia de cobiça, que utilizava a poderosa força da Igreja para enriquecer de forma desonesta, servindo-se da obediência popular ou da lealdade dos índios catequizados, que neles encontravam proteção contra os europeus.

No centro oeste do Brasil, nas Minas Gerais, era costume dos moradores se dar a alguns tipos de jogos de lazer. Em alguns destes jogos, eram utilizadas pequenas pedras para se medir o saldo do ganhador no decorrer das partidas. Estes jogos, na maioria das vezes, ocorriam à noite e sob a luz tênue dos archotes ou candeeiros. Um dos jogadores, a cada vez que vencia a demanda puxava do interior de sua aljava uma pequena pedra esbranquiçada para medir cumulativamente o seu saldo, colocando-as sobre a mesa. Estas pedras, de valor ignorado, passavam a despercebido por todos os integrantes do jogo.

Mas um padre, ao assistir às pelejas, desconfiou das pequenas pedras e sorrateiramente apossou-se de uma delas, descobrindo-lhe o evidente valor. Indagando ao minerador onde as havia encontrado foi por este inocentemente informado que a beira de tal rio, nos sertões daquele serrado, há muitas léguas dali, elas existiam em profusão. Na manhã seguinte, o padre desapareceu misteriosamente do povoado e muito tempo depois se soube que ele descobrira nos sertões das Minas Gerais a maior quantidade de diamantes, jamais vista na colônia brasileira.

Foram os padres da Companhia de Jesus os maiores garimpeiros de ouro ou pedras preciosas da colônia. Quando viajavam acompanhados pelos índios catequizados e à sua disposição, que dirigiam os muares carregados de bugigangas, eram parados pela fiscalização da coroa portuguesa, que procurava ouro e pedras preciosas, de onde cobravam o devido quinto. Entretanto, tudo o que os almotacés encontravam com os padres eram figuras de grandes e pequenos santos, esculpidos em madeira que, segundo justificavam, eram presentes para esta ou aquela capela da região. Muitos anos se passaram, até que o golpe dos padres fosse descoberto.

Certa vez, numa dessas passagens, já liberada a carga pelos fiscais, a junta de asnos foi puxada rispidamente pelo índio que a conduzia. Os quadrúpedes, assustados, se alvoroçaram na manada, sacolejando a “inocente” carga, que foi chão, espatifando-se entre as pedras da estrada todo o carregamento de “santos”. O almotacé, diante da trágica cena, deu voz de prisão a todo o grupo, inclusive aos padres, exclamando estupefato: Santo do pau-ôco!

Vindo a carga ao chão, chocaram-se os madeiros esculpidos contra as pedras do calçamento. Ao romperem-se, deixaram às vistas de todos os que assistiam ao impasse diversas pedras de diamantes, com vários tamanhos, brotando em cascata do interior das estatuetas, que de santas não tinham nada. Diante destes prós e contras das virtudes sacerdotais é que existem versões sobre a possível inidoneidade de Padre Maurício, que poderia ser um religioso sem princípios e cheio de cobiças. Enfim, um verdadeiro “Santo-do-pau-ôco”. Dizem estas versões que o jesuíta do Juquiá enganava a todos os que acreditavam em sua posição sacerdotal e evangélica. A sua conduta perante o pobre garimpeiro espanhol, que morrera no Itatins, era assim explicada, da forma mais coerente possível.

Pois bem. Fazendo uma sintetize da formação moral e histórica da minoria dos jesuítas do Brasil daquela época, vamos aos devaneios curiosos. Padre Maurício não era um homem de ficar garimpando pelos rios de sua vida, acompanhado de um bando de índios cayuás.

O mais certo é que ele realmente havia catequizado alguns indígenas e, em companhia destes, perambulava pelos sertões em busca de alguma coisa de valor que lhe tirasse daquela vida de sertanejo sofredor. Conhecedor de todos os recantos da região do Juquiá, ele deveria saber quem e onde minerava fulano ou cicrano, e quando ou onde aconteciam as descobertas de alguma coisa de muito valor. Pois era padre! Pois participava de todos os anseios dos tementes a Deus. Ouvia todo tipo de confissões, e lhe eram confiados dos mais escabrosos casos até as grandes descobertas. Comia e bebia gratuitamente em qualquer lugar, tendo pernoite certo em qualquer morada e podendo, para isso, escolher as mais abastadas e confortáveis residências. Bastava, portanto, espalhar as suas bênçãos entre as obedientes ovelhas.

Mas tudo isso não evitaria o afastamento daqueles rincões desabitados e sem conforto nenhum, pois o dízimo para a Igreja era muito pouco, ou quase nada. O máximo que se conseguia era a doação de terrenos onde se construíam capelas, ou heranças de grandes áreas de terras, sem herdeiros, e que nada valiam. Entretanto, eis que nesta vida digna de lástima e compaixão, surge aos olhos do Padre Maurício um esbaforido estrangeiro que, vindo da Espanha, consegue para si grande quantidade de ouro, garimpando no Arraial.

O espanhol caíra dos céus, diretamente nas mãos do jesuíta. Querendo voltar à pátria, pernoitou em Goyantãhogoa e ali soube do registro de ouro e do “quinto”, da coroa portuguesa. O padre deve ter pensado quão mesquinho era o estrangeiro, pois, para não pagar o imposto, enterrou todo o seu ouro por ali mesmo. De posse destas informações, ditas por alguém em confissão, mandou ao encontro do garimpeiro um grupo de índios de sua confiança para convencê-lo a seguir ao Itariri e, de lá, escapar pela Serra do Itatins, até o mar. Precisava ganhar a confiança do espanhol, por isso mandou seus índios informá-lo que no Rio Travessão descobriria grande quantidade de ouro. O que realmente aconteceu.

Confiante, o espanhol abriu seu coração e seus segredos ao padre ambicioso, contando-lhe da riqueza enterrada e pensando que um religioso jamais daria importância ao seu ouro. Mas quando o estrangeiro voltou a Goyantãhogoa, com o ouro do Travessão, o padre, para se ver livre do espanhol e tranquilamente desenterrar o ouro, convenceu-o das ricas minas de Pero Vaz. Enquanto o estrangeiro tentava, debalde, uma sociedade com Pero Vaz, o padre Maurício surrupiava-lhe as sete barras de ouro, destruindo qualquer possibilidade de identificação do local.

O espanhol voltou e, atônito, procurou por vários dias o seu tesouro que, estranhamente, nunca descobriu vestígio nenhum de sua localização. Mas, ele ainda tinha o ouro do Travessão, que não era de pouca monta. O jesuíta precisava, também, tomar posse deste valoroso quinhão. Quando o espanhol, na Barra do Rio Juquiá, tentava desviar do Registro, o padre apresentou-se a ele, informando-o do ouro de Aranzel, na Serra do Itatins. O espanhol, rompedor de sertões que era, não se fez de rogado e partiu para o Itatins, tendo em seu encalço o padre avarento e rapinador.

Com a nova quantidade de ouro retirada do Itatins, o espanhol decidiu descansar por uma noite no Porto de Una. O Padre Maurício, em seu encalço, aproveitou a tempestade daquela noite, retirou a riqueza da canoa, que, inadvertidamente, ficara sozinha, e a emborcou, dando a impressão que a culpa fosse dos rigores da variação atmosférica.

Na manhã seguinte, o espanhol descobriu que a desgraça sempre lhe acompanhava e julgou que o seu ouro havia se perdido no lodo do rio. Enlouquecido, embrenhou-se nos sertões atrás de mais ouro e, tempo depois, seu esqueleto fora encontrado na margem de uma lagoa. Com grande “coincidência”, mais uma vez, quem o descobriu foi o padre Maurício. De posse de tão grande fortuna, e não querendo voltar ao Convento de M’Boy, em São Paulo, pois teria que entregar todo o precioso carregamento para a Companhia de Jesus, padre Maurício resolveu que aquela imensa riqueza lhe pertencia, por direito.

Juntando os seus índios, transportou tudo o que havia conseguido ilicitamente, às custas do pobre espanhol, para o Rio Assungui, no Juquiá, onde à margem deste leito, e, como dizem os historiadores “no caminho que vai para o Pilar”, enterrou o seu legado, cuidando em fazer um devido mapa num pedaço de couro de anta para que jamais perdesse o seu tesouro, como havia ocorrido com o espanhol. Mas, o único caminho do Pilar que existia na época era o da “Fazenda do Pilar”, na região de Sorocaba, que mais tarde se transformou na Vila e Município de Pilar do Sul. O município de Pilar do Sul possui a sua divisa com Tapiraí, e, por pouco, não a tem com Juquiá.
Padre Maurício tencionava voltar ao local, depois que as coisas acalmassem. Mas, por ironia do destino, foi chamado de volta para M`Boy, e, de lá, enviado para a Europa, de onde nunca mais pôde retornar. Até hoje o ouro continua no mesmo lugar à espera de quem o encontre. E, como já foi dito, o mapa, de alguma forma, teve o seu conteúdo devassado.

Várias expedições foram feitas e, como não podia deixar de ser, é claro, todas fracassaram. A última delas, que se tem notícia, ocorreu em 1932, com a participação de várias pessoas reconhecidas do Município de Miracatu: os primos Antonio Martins de Castro, Cássio Martins de Castro, Mário e Moacyr de Castro Oliveira, e outros, que quase pereceram, tentando vencer as águas e pedras daquele perigoso Rio Assungui juquiaense, que até hoje guarda aquelas fabulosas riquezas.

Essas lendas ou verdades foram esquecidas quando, precisando expandir a ocupação de terras para a implantação da agricultura, os habitantes de Iguape e das margens do Rio Ribeira lançaram os olhos para os sertões inóspitos e ainda não colonizados efetivamente. Como as terras, Xiririca acima, eram acidentadas e incultas, restou a esquecida bacia hidrográfica do Rio Juquiá, que se mantinha totalmente desprovida de povoados e precariamente habitada.

Já a primeira tentativa para colonizar o Vale do Juquiá acontecera em 1576, quando Pero Magalhães Mondavo, tentando convencer os seus leitores portugueses, descrevia sobre a fertilidade das terras do Juquiá, regada com mil cursos de água e florestas repletas de madeira de lei. Quanto aos indígenas que viviam na região do Itariri, Mondavo assim comentava:

“Se alguém vier para estas terras e consegue escravizar alguns índios, mesmo que não tenha nada que possa chamar de seu, arranja meios suficientes para manter a família com dignidade; pois um deles pesca, outro caça, outros, ainda, semeiam e colhem, tudo fazendo para o forasteiro e sem qualquer despesa de alimentação com ele próprio e com sua família índia”.

Mediante este resumo de informações podemos afirmar, com certeza, que as primeiras descobertas de ouro do Brasil ocorreram nos territórios de Iguape, que, embora tivesse produção mediana ou baixa, desencadeou o ciclo do ouro na colônia, fazendo com que milhares de europeus aventureiros viessem ao Brasil em busca do cobiçado metal. Com a descoberta do ouro Ribeira acima, e com a partida de centenas de famílias de Iguape e Paranaguá embrenhando-se nos sertões inóspitos, fundaram-se pequenos agrupamentos humanos, que se transformaram em povoados, vilas, distritos e municípios; como são os casos de Apiaí, Curitiba, Eldorado (Xiririca) e Iporanga. Para controlar a exploração da mineração, o governo imperial, em fins do século XVII e início do século XVIII, decidiu montar um posto de vigilância para que pudesse cobrar o “quinto” da coroa, que era a taxação de 20% sobre todo o minério descoberto na Bacia do Ribeira. Dessa maneira, foi implantado o “Registro”, e o local de vigia, provavelmente onde hoje se localiza a Igreja de São Francisco Xavier, era comandado por um almotacé (almotacel). Esta autoridade era pessoa de confiança designada pela coroa para conferir pesos e medidas, cobrando o devido imposto.

Embora vários mineradores tenham se embrenhado pelos sertões em busca da cidade de Santos, para fugir do Posto do Registro Imperial, boa quantidade de ouro chegava até Iguape. Decidiu então o governo real implantar ali uma Casa de Fundição, onde, depois de passar pelo Registro e ser oficializado, o ouro era transformado em moedas, barras e similares e, posteriormente, vendido ou enviado a Portugal.

No final do século XVII foram descobertas grandes lavras de ouro nos sertões do interior do país. Este local passou a ser chamado de “As Minas Gerais do Império Brasileiro”, posteriormente conhecido por Minas Gerais. Estas descobertas causaram um grande fluxo de famílias inteiras do Vale do Ribeira e de todas as partes do Brasil para aquela região. Isso exigiu a formação de importante infra-estrutura no que se refere ao abastecimento do transporte animal, como o gado, que forneceria a carne para alimentar a grande massa de migrantes e como as mulas e cavalos. Estes últimos eram mercadorias escassas em terras paulistas e nas novas Minas Gerais.

Por outro lado, Dom Pedro Mendonza, que partiu da Espanha em 1534 para fundar Buenos Aires, trouxe consigo 75 cabeças de cavalos e éguas, que, alguns foragidos, se multiplicaram aos milhares nos campos marginais ao Rio do Prata, durante quase duzentos anos. Isso fez com que a região sul do Brasil passasse a ter o maior rebanho muar de todo o império. Assim, intenso comércio de animais surgiu, com as tropas sendo adquiridas no sul do país e transportadas com grandes dificuldades, desde Viamão, no Rio Grande do Sul, passando por Curitiba e fazendo uma parada de descanso no local onde futuramente seria fundado Jacupiranga. Dali, as tropas prosseguiam pelo Vale do Ribeira afora até atingir o litoral. Dessa forma, iniciou-se a primeira rota terrestre colonial pelo Vale da Ribeira que ficou conhecida como “O Caminho do Gado”. Esse percurso era quase o mesmo que o utilizado atualmente pela atual linha ferroviária Santos-Juquiá e Rodovia BR-116; passando por terras do atual município de Cajati, fazendo parada e de descanso em Jacupiranga e seguindo posteriormente por terras dos atuais municípios de Registro, Juquiá, Miracatu, Pedro de Toledo e Itariri, alcançando o litoral, por Peruybe, e dali prosseguindo pela praia e atingindo a cidade de Santos, onde então subiam a serra e seguiam do planalto paulista para o interior do país.

O Vale do Ribeira, embora muito utilizado pelos primeiros desbravadores paulistas, desde a descoberta do Brasil, mas, por apresentar um relevo por demais acidentado, cheio de áreas alagadiças e cortado por centenas de córregos, ribeirões e rios, teve por essa razão o seu desenvolvimento sobremaneira prejudicado. Os tropeiros percebiam o grande prejuízo ocasionado pelo enorme tempo despendido neste percurso, além da grande perda de animais que trilhavam por veredas apertadas entre as árvores, e onde se perdiam, também, alguns homens das comitivas, que nessa travessia adquiriam moléstias variadas, entre elas a febre amarela, malária, tifo, câimbras de sangue e outras, perecendo muitas vezes pelos caminhos e ali sepultados. 
Dessa forma, optou-se por nova rota, menos acidentada e não tão pantanosa e mortal. Utilizando um novo caminho, as tropas vindas de Viamão seguiam até Curitiba e, de lá, desviando do Vale do Ribeira e do Juquiá, rumavam para o planalto paulista, formando os povoados de Ponta Grossa e Itapetininga, até atingir o local onde todos se reuniam para descansar e realizar permutas ou vendas de animais. Na parada de Biroçoiaba desenvolveu-se um importante ponto comercial (atual Sorocaba). Após descansarem neste povoado as tropas seguiam viagem para o centro-oeste.

Em detrimento do péssimo relevo e terrenos alagadiços do Vale do Ribeira e do Juquiá, os povoados de Ponta Grossa e Itapeva prosperaram lenta e progressivamente, enquanto Itapetininga e Sorocaba passaram a ser importantes centros de compras, venda, troca de animais e comércio de outras mercadorias, progredindo rapidamente e se transformando em grandes núcleos populacionais e comerciais. Posteriormente, com nova descoberta de ouro nos arredores do povoado de Curitiba e com a queda da produção deste minério no Vale do Ribeira, centenas de outras famílias abandonaram mais uma vez a região e para lá se dirigiram, contribuindo com o progresso daquela cidade. No final do século dezoito, a produção de ouro no Ribeira já havia caído drasticamente, exaurindo-se quase por completo a mineração.

Assim, os habitantes de Iguape, que não abandonaram a região em busca de melhor sorte, em fins do século XVIII começaram a voltar os olhos para a agricultura que ainda se mantinha como forte meio de comércio e grande lucro, instalando-se definitivamente à terra fértil e alcançando secular e grande produtividade na cultura do arroz, com produção que ultrapassava a 100.000 alqueires e cuja qualidade do cereal ficou conhecida no mundo todo. Assim, os habitantes de Iguape, que não abandonaram a região em busca de melhor sorte, em fins do século XVIII começaram a voltar os olhos para a agricultura que ainda se mantinha como forte meio de comércio e grande lucro, instalando-se definitivamente à terra fértil e alcançando secular e grande produtividade na cultura do arroz, com produção que ultrapassava a 100.000 alqueires e cuja qualidade do cereal ficou conhecida no mundo todo.

No início do século XIX a abertura do Valo Grande viria assorear o porto de Iguape, dificultando o comércio com o resto do Brasil. Os estaleiros e o porto, que fizeram o progresso da cidade, iniciaram forte declínio em sua movimentação. Mesmo diante de muitas dificuldades o município de Iguape continuou como principal centro comercial do Vale do Ribeira e de seu concorrido porto escoavam os produtos e materiais produzidos na região, ou para ele convergiam os comprados. Da tresloucada corrida ao ouro resultaram as vilas de Xiririca (Eldorado) e Iporanga, que estavam ligadas comercial e consanguineamente à litorânea cidade de Iguape, enquanto Apiaí fazia o seu comércio com o interior paulista.

Para se falar do início da ocupação do Vale do Juquiá, devemos lembrar que isso somente aconteceu graças à migração de famílias inteiras de “sem terras” que vieram de vários povoados e cidades às margens do Rio Ribeira para se instalarem na nova região de terras férteis e baratas. Se fizermos o regresso genealógico, pelo menos até o ano de 1830, podemos observar que as famílias se misturaram consanguineamente e esse fato pode até confundir os mais desavisados. Assim, a fundação da Vila de Santo Antonio de Juquiá se deveu às famílias advindas de Iguape e Xiririca (Eldorado), com menores reflexos migratórios oriundos de Cananéia, Apiaí e Iporanga.

Após a fundação de Juquiá, a primeira Freguesia da região, e com a formação do povoado de Prainha, o entrelaçamento consanguíneo ficou ainda mais restrito. Isso não impediu que ocorressem várias rusgas políticas e sociais entre os dois povoados que emergiam. Para se conhecer a origem dos antigos moradores do Juquiá é necessário citar um pouco da história dos municípios do Vale do Ribeira que forneceram grandes ondas migratórias de famílias para o lugar. 

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