Esta semana andei pesquisando, inquirindo alguns estudantes da cidade para saber se eles já tinham ouvido falar numa pessoa chamada "Tio Miguer".
Confesso que a resposta em breve negativa deles me surpreendeu.
O que me deixou mais triste foi saber que os livros do poetinha sertanejo de São Miguel Arcanjo, falecido em dezembro de 2.012, estão encalhados, que ninguém os compraria em nenhuma livraria, como almejam seus parentes.
"Tio Miguer" sempre fez ele mesmo seus livretinhos, tirando cópias e distribuindo para amigos e conhecidos.
E é assim mesmo que tem que ser feito numa cidade como a nossa: o poeta deve distribuir seus livrinhos de graça para tornar-se conhecido.
Que façam isso com os livrinhos do "Tio Miguer" e os ofereçam em doação para as crianças levarem as suas casas, onde elas poderão manusear quando quiserem ou sentirem vontade.
Por isso que eu acho que é importante que as pessoas sejam conhecidas em vida, que as escolas, antes de mandarem seus alunos copiarem uma biografia de Ziraldo, por exemplo, sem identificação alguma conosco, ofereçam espaço para que as crianças conheçam os artistas, cantores, compositores, poetas e historiadores da própria localidade.
Depois de mortas, para que?
Para que seus parentes levem os louros?
Miguel dos Santos Terra, o "Tio Miguer", era gente do meu coração.
O amor que eu sentia por ele era incondicional, primeiramente por ter sido em vida um grande amigo de meu pai.
Ele, mais meu pai Luiz Válio Júnior, mais Chico Terra e o Quitu formavam o quarteto de moços mais unido da cidade lá pelos anos 40, época em que se ligava na palavra de honra, no aceno de um dedo no chapéu, no valor da amizade, na dignidade da pessoa.
"Tio Miguer" levou para o túmulo muitos segredos que ele guardara.
Por que sei dos seus segredos?
Porque a cada visita minha, ele ia logo me avisando:
- Luiza, adoro você, como adorava seu pai, mas não me peça para falar do passado, principalmente da política do passado aqui em São Miguel; existem muitos segredos e eu não posso dizer nada para não trair minha família que acabou se misturando, pelos casamentos, com os Fogaça e os França.
E eu ficava bem feliz só de ouvir essa sua explicação, coisa que eu já cresci sabendo, pois minha família era da ala contrária aos ricaços do pedaço, justamente os Fogaça e os França.
Mais feliz eu ficava quando conversávamos sobre coisas mundanas ou sobre suas poesias "caipiras".
- Eu não sei o que que acontece comigo, Luiza. Quando sento para escrever qualquer coisa, já me sinto dominar pela força de uma outra pessoa, um caipira que eu nem sei o nome, nem de onde vem, nem onde mora, nem por que me escolheu, só sei que ele me faz escrever na língua dos caboclos do mato.
Eu entendia isso, porque sei, como poeta, que aquele que escreve acaba sempre emprestando sua alma e seu tempo para que outros seres, moradores de outras esferas, possam descer e se comunicarem conosco nos dias de hoje.
Porque a vida é assim um grande e delicioso mistério.
"Tio Miguer" e meu pai, se ainda vivos, neste ano fariam 92 anos, já que nasceram no ano de 1.921.
A benção, "Tio"!
A benção, pai!
- A foto ilustrativa traz "Tio Miguer" ladeado pela também saudosa irmã Zélia Terra França e pelo poeta Hamilton Vieira, num evento que fizemos no Centro Comunitário "Adelina Prandini Ribas", homenageando a primeira diretoria da Corporação Musical Sãomiguelense.
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