sábado, 6 de dezembro de 2014

UMA DE PAPAGAIO

Era um dia de calor. Bati numa porta, com vontade de pedir água.
- Ô de casa!
Uma voz de homem perguntou lá de dentro:
- Ô de fora! Quem é?
E eu respondi:
- É de paz. O senhor faz favor de arranjar uma sede de água para um viajante?
-”– “Não posso, tornou a voz. Não posso porque estou amarrado”.
Espantei-me:
- “Como? Quem amarrou o senhor? Diga, que eu desamarro.
- “Não se incomode não, moço, foi a resposta. Aqui em casa o costume é este. Vivo acorrentado” 
Nessa altura uma velha apareceu com um caneco de água e falou:
- “Cala a boca. Deixa de tomar confiança com quem tu não conheces.”
Bebi e ia agradecer quando percebi que ela se dirigia a um papagaio que batia as asas, na gaiola pendurada à parede.

Autor: Graciliano Ramos - "Alexandre e Outros Heróis", 1969.

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