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Quem foi Harriet Tubman, a nova cara da nota de 20 dólares.
Nascida na escravidão, Tubman não só conseguiu se libertar como capitaneou missões que levaram à libertação de dezenas de escravos.
TERESA PEROSA/ 20/04/2016
O secretário do Tesouro americano, Jack Lew, anunciou nesta quarta-feira (20) seus planos para substituir a ilustração do ex-presidente dos Estados Unidos Andrew Jackson, que hoje adorna a nota de US$ 20, pela da ex-escrava Harriet Tubman. Tubman lutou na causa abolicionista antes e durante a Guerra Civil Americana e é considerada uma das heroínas da história do país.
A mudança na nota de US$ 20 virá acompanhada ainda de outras inovações: de acordo com o site Politico, a nota de US$ 10 estampará em sua parte de trás efígies de mulheres do movimento sufragista americano; e a nota US$ 5 será modificada para incluir líderes do movimento pelos direitos civis dos negros no país.
A renovação – programada para ocorrer até 2020, centenário da conquista do voto feminino nos Estados Unidos – é resultado de uma campanha realizada pelo grupo Women on 20s (Mulheres nas Notas de 20, em tradução livre). A organização reúne ativistas que, desde o começo de 2015, pressionam o governo americano para que mulheres tenham sua representação na moeda do país, hoje integralmente ilustrada por homens. No ano passado, o grupo conduziu uma pesquisa online sobre quem deveria ser a primeira mulher a ser representada. Das 600 mil pessoas que participaram, quase 40% escolheram Tubman.
O alvo principal da campanha, a nota de US$20, antes da campanha pela inclusão de Tubman, já era alvo de questionamentos. Jackson, o sétimo presidente dos Estados Unidos, tem contra si o fato de que era contra o uso da moeda em papel. Ele preferia as transações em ouro e prata. Além disso, era um defensor da escravidão e exerceu papel importante na tomada de terras de povos indígenas em território americano. Dentre os objetivos citados pela declaração do Women on 20s, encontra-se “a remoção de símbolos de ódio, intolerância e desigualdade, para permitir a igualdade que estimulará o potencial de todas as pessoas independente de gênero, raça, etnia, orientação sexual ou identidade”. Jackson deixará a parte da frente da nota, mas se manterá na face traseira, o que rendeu críticas por parte de grupos e ativistas ao Tesouro americano.
Ativistas pediam desde o começo de 2015 que Tubman fosse colocada na nota de US$ 20 no lugar de Andrew Jackson - acima, uma mulher no estado de Nova York, segura montagem projetando a mudança (Foto: ASSOCIATED PRESS/ AP)
Harriet Tubman nasceu em Maryland, estado localizado entre o sudeste e o noroeste americano, na década de 1820.
Harriet Tubman nasceu em Maryland, estado localizado entre o sudeste e o noroeste americano, na década de 1820.
Como escrava, aos seis anos começou a trabalhar como servente doméstica.
Aos 13, foi enviada para trabalhar nos campos da fazenda onde vivia.
Ela viu suas irmãs serem vendidas, os pais idosos trabalharem como escravos e carregou por toda a vida marcas físicas da escravidão: além das cicatrizes deixadas por chicotes, ela ganhou uma deficiência permanente depois de receber uma forte pancada na cabeça, desferida por um feitor e destinada a outro escravo a quem Harriet tentava defender – ela nunca se recuperou completamente e como consequência, por vezes caia em sono profundo sem querer.
Em 1849, conseguiu fugir rumo ao norte e se instalou na Filadélfia, onde arrumou emprego e moradia.
Em 1849, conseguiu fugir rumo ao norte e se instalou na Filadélfia, onde arrumou emprego e moradia.
Harriet trocaria a segurança da liberdade no Norte para voltar a Maryland uma dezena de vezes para libertar outros escravos. Operando nas Underground Railroads (Rotas Subterrâneas) – como ficaram conhecidos o conjunto de estradas, caminhos e esconderijos secretos usados por escravos e abolicionistas para libertação de pessoas – Harriet comandou missões a seu estado natal para libertar entre 60 e 70 escravos, entre parentes e amigos.
Ela disse que “nunca perdeu nenhum passageiro”, o que lhe rendeu o apelido o título de “a mais hábil condutora” das Rotas Subterrâneas.
A determinação e tenacidade também lhe renderam o apelido de “General Tubman”, dado pelo abolicionista John Brown, que também a qualificou como “uma das pessoas mais corajosas do continente”.
Nos Estados Unidos, ela se tornou mais conhecida por sua participação durante a Guerra Civil Americana (1961-1965). Kate Larson, historiadora e autora da biografia Bound for the Promised Land – Harriet Tubman: portrait of an American Hero (Destinada à Terra Prometida – Harriet Tubman: retrato de uma heroína americana, em tradução livre), qualifica Harriet como um “camaleão” – ela atuou como professora, cozinheira e espiã, conectando as tropas da União com redes de informações de escravos. "Ela é lembrada por sua determinação nas Rotas Subterrâneas, não só para se libertar, mas voltar diversas vezes para resgatar sua família e amigos, pondo sua vida em grande risco”, afirma Larson. “Muito poucas pessoas fizeram isso, e Tubman não o fez uma ou duas vezes, mas 13 vezes. Ela enfrentou a possibilidade de ser morta muitas vezes, quase foi capturada muitas vezes e continuou lutando contra a escravidão a cada momento que pôde. Ela nunca desistiu, ela continuava em frente”, diz a autora. Embora tenha tido um papel ativo, Tubman levaria 30 anos para conseguir do governo americano a pensão que lhe era de direito como “veterana” da Guerra Civil.
Nos Estados Unidos, ela se tornou mais conhecida por sua participação durante a Guerra Civil Americana (1961-1965). Kate Larson, historiadora e autora da biografia Bound for the Promised Land – Harriet Tubman: portrait of an American Hero (Destinada à Terra Prometida – Harriet Tubman: retrato de uma heroína americana, em tradução livre), qualifica Harriet como um “camaleão” – ela atuou como professora, cozinheira e espiã, conectando as tropas da União com redes de informações de escravos. "Ela é lembrada por sua determinação nas Rotas Subterrâneas, não só para se libertar, mas voltar diversas vezes para resgatar sua família e amigos, pondo sua vida em grande risco”, afirma Larson. “Muito poucas pessoas fizeram isso, e Tubman não o fez uma ou duas vezes, mas 13 vezes. Ela enfrentou a possibilidade de ser morta muitas vezes, quase foi capturada muitas vezes e continuou lutando contra a escravidão a cada momento que pôde. Ela nunca desistiu, ela continuava em frente”, diz a autora. Embora tenha tido um papel ativo, Tubman levaria 30 anos para conseguir do governo americano a pensão que lhe era de direito como “veterana” da Guerra Civil.
Foto de Harriet Tubman, por volta de 1885, adquirida pelo museu Smithsonian, em Washington D.C. (Foto: Chip Somodevilla/Getty Images)
Depois do fim da guerra, Tubman viveu uma longa vida ao lado da família em Auburn, no estado de Nova York, onde passou a apoiar o movimento sufragista, que lutava pelo direito ao voto das mulheres.
Depois do fim da guerra, Tubman viveu uma longa vida ao lado da família em Auburn, no estado de Nova York, onde passou a apoiar o movimento sufragista, que lutava pelo direito ao voto das mulheres.
"O New York Times sempre tem um artigo no fim do ano sobre as pessoas notáveis do mundo que morreram naquele ano. Quando ela morreu, em 1913, foi citada como uma das pessoas mais famosas a morrer naquele ano – seu nome estava ao lado de reis e rainhas, autores famosos e industriais.
Isso é extraordinário, para uma mulher negra nos Estados Unidos em 1913 receber esse tipo de honraria", afirma Larson. Durante sua vida, prolífica em atos, não deixou um documento escrito de próprio punho – como a maioria dos escravos, Harriet nunca foi alfabetizada. Ainda assim, é lembrada como uma grande oradora.
Considerando o momento atual nos Estados Unidos – com o surgimento de movimentos como o Black Lives Matter (Vidas Negras Importam), que denunciam o tratamento dado a negros no país pelas forças de segurança, e o fato de o mandato do primeiro presidente negro do país, Barack Obama, se encaminhar para seu fim – a mudança na nota de US$ 20 pode ter uma simbologia muito importante, de acordo com Larson. “Representa o quanto Tubman lutou para que esse país avançasse em questões de liberdade e igualdade. Nós progredimos bastante, ainda temos um longo caminho a percorrer, mas ela realmente mudou o mundo e tê-la naquela nota vai ajudar a levar adiante uma conversa que esse país tem tido dificuldade de levar: o legado da escravidão e como nós ainda vivemos com esse legado hoje. Ela vai nos ajudar a ter essa conversa de forma mais ampla e significativa. E nós, como um povo, nós temos que estar incrivelmente orgulhosos", afirma.
Considerando o momento atual nos Estados Unidos – com o surgimento de movimentos como o Black Lives Matter (Vidas Negras Importam), que denunciam o tratamento dado a negros no país pelas forças de segurança, e o fato de o mandato do primeiro presidente negro do país, Barack Obama, se encaminhar para seu fim – a mudança na nota de US$ 20 pode ter uma simbologia muito importante, de acordo com Larson. “Representa o quanto Tubman lutou para que esse país avançasse em questões de liberdade e igualdade. Nós progredimos bastante, ainda temos um longo caminho a percorrer, mas ela realmente mudou o mundo e tê-la naquela nota vai ajudar a levar adiante uma conversa que esse país tem tido dificuldade de levar: o legado da escravidão e como nós ainda vivemos com esse legado hoje. Ela vai nos ajudar a ter essa conversa de forma mais ampla e significativa. E nós, como um povo, nós temos que estar incrivelmente orgulhosos", afirma.
Além da nota de US$ 20, recentemente dois parques foram nomeados em sua homenagem nos Estados Unidos.
A atriz afro-americana Viola Davis, indicada a prêmios e conhecida por sua atuação no filme Vidas Cruzadas, já anunciou que protagonizará sua cinebiografia. "Ela está recebendo o que merece. A significância disso é que as pessoas olharão para essas notas todo santo dia, eles pensarão sobre sua luta, eles pensarão sobre o legado da escravidão nesse país, talvez isso leve as pessoas a fazer algo e isso fomentará a discussão sobre racismo, vai mudar a vida das pessoas”, diz Larson.
“Tubman teria amado isso, teria sido o que ela queria”.
ÉPOCA
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