domingo, 3 de junho de 2018

LOCAUTE E SEUS ASPECTOS PENAIS

Leandro Falavigna e Paulo Tiago Sulino Muliterno 

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estes últimos dias, a greve dos caminhoneiros trouxe severas consequências a diversas cidades e capitais do Brasil, notadamente em razão de bloqueios impostos em rodovias estaduais e federais, que impediram a circulação de caminhões carregados de matérias-primas e bens de consumo, por vezes até de forma violenta. 
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Tal paralisação desencadeou crise de desabastecimento de combustíveis e, consequentemente, problemas graves em sistemas de produção. 
Nesse contexto, muito se falou sobre "locaute" (do inglês lock out; literalmente, "trancar para fora"). 
Mas o que seria o "locaute" e quais seus reflexos penais? 
Em síntese, o "locaute" ocorre quando as atividades de produção ou trabalho são paralisadas por iniciativa dos empregadores ou com seu apoio, motivados por seus próprios interesses e sem expressa autorização de Tribunal competente, de modo que os trabalhadores são impedidos de realizarem suas atividades. 
Tal prática é expressamente vedada pelo art. 722, da CLT, que inclusive prevê sanções aos responsáveis. 
Além de implicações administrativas, pode haver consequências penais para tal prática. 
O CP traz, em seu Título IV, os "Crimes Contra a Organização do Trabalho", dentre os quais se destaca o art. 201, que trata da paralisação de trabalho de interesse coletivo 1. 
Isto porque, a paralisação das atividades e os bloqueios impostos em todo o Brasil não somente poderiam configurar o "locaute", mas também verdadeira suspensão ou abandono coletivo de trabalho, provocando, ainda que por via reflexa, a interrupção de obras públicas e/ou serviços de interesse coletivo. 
Maquinário pesado utilizado na construção, ônibus urbanos, ambulâncias, viaturas policiais, caminhões de lixo e até mesmo carros funerários – muitos são os exemplos de atividades essenciais e de interesse coletivo afetados pelo desabastecimento de combustíveis. 
Isso sem levar em conta as escolas e os hospitais que têm suas funções prejudicadas por falta de insumos indispensáveis (alimentos frescos para merendas, remédios, materiais hospitalares, dentre outros), que não são transportados ou são impedidos de chegar a seus destinos em razão de suposto "locaute". Ou seja, serviços essenciais e de interesse coletivo são interrompidos. 
Além disso, o art. 3º, inciso IV, da lei de crimes contra a economia popular (lei 1.521/51) prevê ser fato típico "reter ou açambarcar matérias-primas, meios de produção ou produtos necessários ao consumo do povo, com o fim de dominar o mercado em qualquer ponto do País e provocar a alta dos preços". Neste sentido, o que não falta são economistas prevendo a alta dos preços em razão da paralisação dos caminhoneiros (e das desastrosas soluções oferecidas pelo governo), o que vai ao encontro do artigo 3º da citada lei. 
E não só: o art. 7º, inciso VIII, da lei 8.137/90, prevê também como crime "destruir, inutilizar ou danificar matéria-prima ou mercadoria, com o fim de provocar alta de preço, em proveito próprio ou de terceiros". 
Fato é que a correta tipificação dos fatos dependerá da investigação do caso em concreto, que inclusive poderá ser subsumido a outros tipos penais. Já há, até mesmo, notícia de que a Polícia Federal instaurou inquéritos policiais para investigar tais fatos e que, inclusive, há mandados de prisão expedidos. Enfim, quem viver, verá. 

1 Embora a lei 7.783/89 (a "lei de greve") garanta e regulamente o direito de greve, a partir do art. 9º da CFde 1988, há limitações impostas aos trabalhadores no que diz respeito a serviços ou atividades essenciais, nos artigos 11 e 15. 

*Leandro Falavigna é advogado criminalista no escritório Torres Falavigna Advogados. 

*Paulo Tiago Sulino Muliterno é advogado criminalista no escritório Torres Falavigna Advogados. 

Fonte: Migalhas.

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