“A lama do setor público brasileiro é muito maior do que as de Mariane e Brumadinho juntas, por isso a necessidade de restrições às informações”.
A frase acima não é minha. ”Plagiei-a” do Doutor Ricardo Bergamini, talvez o profissional liberal mais capacitado de todos em matéria de “contas públicas”, o qual sempre teve como preciosa fonte de informações os documentos disponibilizados por força da lei de acesso à informação, que a partir de agora serão bem mais restritos.
O problema todo começa lá na Constituição de 1988, que disciplina um “faz-de-conta” de livre acesso às informações a dados públicos, nas esferas federal, estaduais e municipais, conforme previsto nos seus artigos 5º, XXXIII; 37, II, par. 3º, e 216, par. 2º, os quais estabelecem, como regra geral, o livre acesso às informações, porém com as restrições de SIGILO a serem determinadas na legislação infraconstitucional.
Debruçando-se sobre o dispositivo constitucional, apesar de passados 21 anos da entrada em vigor da nova Constituição, o legislador ordinário acabou aprovando a Lei Nº 12.527/2011, que “regula o acesso à informação”, sancionada pela Presidente Dilma Rousseff.
Pelo artigo 4º dessa lei (12.527/11), a INFORMAÇÃO SIGILOSA é definida como “aquela submetida temporariamente à restrição de acesso público...”. Pelo artigo 24, par. 1º, ”os prazos máximos de restrição de acesso à informação, são de 25 anos para os documentos ULTRASSECRETOS, 15 anos para os SECRETOS, e 5 anos para os RESERVADOS.
No artigo 27 dessa lei, são definidas as autoridades competentes para definir o grau de sigilo, ficando expresso no par. 1º desse artigo, que a definição dos documentos SECRETOS e ULTRASSECRETOS “PODERÃO SER DELEGADOS”.
Regulamentando a referida lei (12.527/11), a Presidente Dilma assinou o Decreto Nº 7.724/2012. Apesar da Lei 12.527/11, permitir no seu artigo 27, par. 1º, a delegação da definição dos documentos SECRETOS e ULTRASSECRETOS, o Decreto presidencial VEDOU a delegação de competência para essa classificação nos graus de sigilo SECRETO e ULTRASSECRETO.
É justamente aí que reside a grande diferença entre os Decretos de Dilma e de Mourão. (Decreto 9.690/19). Mourão “abriu as portas” para uma infinidade de outros servidores públicos terem o poder de definir o grau de sigilo, inclusive de documentos SECRETOS e ULTRASSECRETOS. Com isso todo serviço público passou a representar a legítima “Casa da Mãe Joana”, onde todo mundo manda, inclusive servidores mais “chinelões”.
Com essa atitude governamental, certamente houve forte agressão ao espírito da lei de acesso à informação, ficando muito mais fácil acobertar a corrupção. Apesar do Decreto de Mourão ter alterado o Decreto de Dilma, ampliando expressivamente o número de servidores públicos habilitados a definir documentos SECRETOS e ULTRASSECRETOS, na verdade o mesmo não contrariou a Constituição, nem a lei específica.
Sérgio Alves de Oliveira - Advogado e Sociólogo
Nenhum comentário:
Postar um comentário