Oh, Deus todo poderoso, por que nos abandonaste? Tantas foram nossas súplicas. Tantos foram nossos chamados. Tantas orações e preces. Por que não nos ouviste? Onde estava o Todo Poderoso quando as prisões sem julgamento começaram a se banalizar? Onde estava Vossa Santidade que não nos ouviu quando as pessoas estavam sendo levadas à força para depor em delegacias de polícia, nas chamadas conduções coercitivas? Onde estavas quando prisões começaram a ser usadas para extrair delações premiadas?
Por que nos abandonaste Deus, todo poderoso? Por ande andava o Altíssimo quando a lei que expressamente proíbe cumprimento de pena antes do trânsito em julgado foi dilacerada em nome do combate à corrupção? Quanto desamparo reinou sobre nós estes anos todos.
Onde estava nossa Luz Maior quando denunciamos os excessos acusatórios da Lava Jato e o abuso de autoridade que se alastrava como fogo em nome do combate ao crime, em especial, a corrupção? A propósito, onde estava nosso Pai quando o projeto do Senador Roberto Requião sobre o abuso de autoridade foi discutido? Onde estava nosso Deus maior quando seus enviados mais célebres propuseram um pacote medidas que lhes garantiriam carta branca para fazerem o que bem quisessem? E o Reitor? Onde estava nosso Todo Poderoso quando o reitor tirou a própria vida por causa de uma prisão absurda e ilegal? Oh Senhor, Altíssimo, onipresente e onipotente, como pôde permitir tanta miséria, tanta mazela, tanta iniquidade? Como pôde permitir que tantas reputações fossem arrasadas com vazamentos ilegais, sem tomar qualquer providência? Onde estava quando advogados começaram a ser colocados na mesma vala comum de seus clientes? Onde estava o senhor, todo Poderoso quando um juiz resolveu inverter a ordem, constrangendo Desembargadores e Ministros, julgando casos fora de sua jurisdição, fazendo as vezes de investigador, acusador e julgador? Como chamei pelo Senhor meu Pai!!!!
Eu entendo que agora estão atrás de ti, lhe causando aborrecimentos, me compadeço do sofrimento causado por buscas excessivas, talvez até abusivas, e de cerceamentos de Vossa Santa Liberdade e até de Vossa Imaculada Intimidade. Quantas vezes não suplicamos para que as fizesse cessar, para que não as deixasse triunfar, mas fomos respondidos com a soberba de quem detém o dom do justo absoluto, fomos achincalhados, desmoralizados e ridicularizados.
Entendo que agora o Senhor queira ouvir minhas preces, minhas orações e minhas Odes de amor a tudo que o senhor representa. Mas nestes anos todos, enquanto o senhor dormia, no regozijo dos que se intitulavam justos, e nos deixava à própria sorte, nós tivemos que lutar, lutar por um mínimo de respeito ao que sobrava do seu patrimônio moral e espiritual: o Direito, a Lei, a Constituição Federal e o Estado Democrático.
Fomos obrigados a trocar orações por luta diária. E agora, só agora, Santa Virtude, o Senhor nos faz o chamamento? Só agora queres a minha prece, o meu suplício? Não sei se creio mais no Senhor, Todo Poderoso, nem em ti, nem em nada. Não sei se não lhe perdi a fé. Ou, se ainda não lhe perdi completamente, quanto tempo levarei para recuperá-la?
Prefiro neste momento acreditar nos homens, frágeis homens, humanos, demasiadamente humanos, com seus erros e acertos, mas que durante todos estes anos não hesitaram em defender, com enorme sacrifício de sua paz pessoal, os princípios que o Senhor, Todo Poderoso, sempre pregou, princípios que me fizeram a professar sua fé, rezar na sua cartilha, amar-te como a ninguém mais.
Perdoe-me, Santa Dignidade, mas minha fé, hoje, está com eles, apenas e tão somente com eles, estes senhores de carne e osso, imperfeitos, que o defendiam enquanto o Senhor se esbaldava na ribalta da fama e dos aplausos fáceis.
Enquanto Vossa Plenitude colhia os louros por uma justiça de ocasião, eles velavam para que o Senhor, Deus, Todo Piedoso, pudesse continuar a existir. Fico com eles para salvar tua honra, fico com eles para preservar tua memória, fico com eles por amor incondicional a ti, meu Pai, Todo Poderoso, Esplendor maior do Universo e da Existência!
Fonte: Migalhas, 21/04/2019.
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