Opinião: Não basta Bolsonaro, o Congresso vai eleger um acusado de agredir mulheres?
O candidato de Bolsonaro para substituir Rodrigo Maia, parece não se diferenciar de seu padrinho.
Por Maria Frô 22 jan 2021
Foto: Agência Brasil
Os tempos sombrios que invadiram o Brasil desde o Golpe 16 parece não ter fim.
O país através de um golpe misógino, com o Congresso inventando um crime que não existia e foi criado apenas para golpear Dilma Rousseff, agora tem como favorito para eleição na Câmara um deputado acusado pela ex-mulher de ser agressor.
Bolsonaro é um presidente declaradamente machista, misógino e com histórico de agressão de mulheres, mesmo que elas sejam seus pares na Câmara, como Maria do Rosário. Bolsonaro se orgulha das declarações machistas e homofóbicas que desfere contra aqueles que elege como inimigo político seja ao se referir ao governador do estado de São Paulo como “calça apertada” seja na declaração de voto do impeachment, em 17 de abril de 2016, quando homenageou Brilhante Ustra, o torturador de Dilma Rousseff.
O candidato de Bolsonaro para substituir Rodrigo Maia, parece não se diferenciar de seu padrinho. No dia 14, a Folha entrevistou Jullyene Lins, ex-mulher do deputado Arthur Lira (PP-AL), que concorre à presidência da Câmara. Jullyene, que tem dois filhos com Lira e com ele permaneceu dez anos, relatou na entrevista que o parlamentar a agrediu fisicamente, a ameaçou para que mudasse seu depoimento (o primeiro processo contra o ex-marido é de 2006) e usou seu nome para abrir uma empresa. Segundo Jullyene, em entrevista à Veja em 2019, o patrimônio de Lira era muito maior do que ele declarava no imposto de renda e foi obtido por meio de propinas diversas e esquema de “rachadinha” ainda na Assembleia Legislativa de Alagoas, quando era deputado estadual.
Como se não bastasse as acusações no STF onde Arhur Lira é réu em duas ações, acusado de fazer parte de uma organização criminosa para saquear a Petrobras e de receber propina de 106 mil reais em um esquema de corrupção na Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU), o deputado é acusado de agredir por diversas vezes sua ex-mulher.
Os relatos de Jullyene são chocantes, quase uma hora de agressões. Segundo a ex-mulher, ela se separou do deputado com o filho mais novo com apenas 23 dias de vida, porque havia se cansado das traições do ex-marido. A primeira denúncia de 2006 foi por agressão corporal. Ela relata que quando abriu a porta Lira lhe deu socos e pontapés e chegou a esganá-la, xingá-la por cerca de 40 minutos.
Mesmo tendo a mãe, a babá e o irmão como testemunhas e laudo do IML, Jullyene continuou sendo ameaçada e agredida por Lira para que retirasse a queixa. Como todo agressor, o uso do poder e da força são as armas: ‘Ou você fala o que eu quero ou você vai perder os meninos porque quem manda aqui sou eu, o que eu quiser eu faço e aconteço. Ou você faz isso, ou nunca mais você vai ver seus filhos’.”
De acordo ainda com a ex-mulher de Lira, este a obrigou a prestar depoimento acompanhada do advogado do ex-marido que a cutucava por debaixo da mesa avisando o que e quando falar. Resultado, Lira foi absolvido em 2015.
Jullyene ficou com fama de mentirosa e em matéria de hoje na Veja, seus próprios filhos saem em defesa do pai e a acusam de oportunista: “É uma extorsão. Toda vez que meu pai está em período de ascensão, ela está lá para descer o pau e tentar arrancar uma casca, um dinheiro.”
É bastante comum que as mulheres, vítimas de agressão sejam desacreditadas por seus agressores, culpabilizadas pelo próprio crime de que são vítimas. O envolvimento dos filhos em disputas de casais, especialmente entre os mais ricos também é bastante corriqueiro.
Jullyene lamenta o envolvimento dos filhos e responde às acusações afirmando que não tem mais nada, que perdeu o apoio de sua própria família com as ameaças e “lavagem cerebral” exercida pelo ex: “Me machuca muito a maneira como eles estão sendo envolvidos numa situação que não lhes cabe. Isso é um golpe baixo. Meus filhos passaram por uma lavagem cerebral.”
Além das denúncias de 2006/2007, do processo para pagamento de pensão em disputa até 2019, Jullyene diz que sua autonomia financeira foi destruída pelo ex-marido que a usou como “laranja”. Afirma ainda que não consegue abrir contas em bancos e responde por causas trabalhistas.
Na batalha contra o ex-marido Jullyene conseguiu na Justiça medida protetiva, impedindo Lira de se aproximar dela e ultrapassar o limite de distância estipulado pela lei. Ela conta que, depois desta vitória, chegou a ouvir de seu ex-marido a seguinte ameaça: “onde não há corpo, não há crime”. Na entrevista, ela narra o que é viver sob eterno medo, depressão, comum nos casos de mulheres vítimas de violência.
Após a publicação da entrevista de Jullyene para a Folha o deputado afirmou que as denúncias eram “requentadas” e em tom de ameaça disse: “O resultado deste processo é de conhecimento público, inclusive, por parte deste veículo de comunicação, de forma que, a repetição e veiculação da falsa acusação, atrai a responsabilidade penal e cível não só de quem a pratica, mas também de quem a reproduz, ante a inequívoca ciência da sua falsidade”
“Não basta ser honesto é preciso parecer honesto“
Joe Biden assumiu a presidência dos Estados Unidos e além de sua vice ser uma mulher negra, de seu ministério respeitar a paridade de gênero, convidou para comandar a pasta da Saúde e lidar com a pandemia Rachel Levine, uma mulher trans.
Enquanto isso, no Brasil, o ditado “Não basta ser honesto é preciso parecer honesto” nunca foi tão desvalorizado por nossos políticos, especialmente na Câmara Federal.
Neste momento turbulento em que vivemos, o que significa eleger um presidente sob suspeita de agredir sua ex-mulher e com ações no STF ?
Penso ser inadmissível que, nos dias de hoje, com 215 mil mortes que poderiam ser evitadas se não fosse a atuação de um projeto político genocida, com pesquisa da USP comprovando a ação deliberada de Bolsonaro; com o aumento de casos de feminicídios e toda a ordem de agressão contra mulheres, contra negros e comunidade LGBTQIA+ desde a eleição de Bolsonaro, que o Congresso tenha como favorito um deputado que acumula tantas denúncias e não apenas de corrupção.
Nenhum cargo negociado vale eleger um suspeito de tanta violência contra a mulher. O voto para eleição da mesa diretora é secreto, mas deveria ser aberto, para que possamos saber quantos apoiam um deputado com esse “currículo’.
*Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Revista Fórum.
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