Álvaro Fraga
O escândalo da sofrência, ou o jabá do sertanojo, com desvio de verbas públicas destinadas à saúde e à educação para pagamento de cachês milionários a artistas que apóiam o governo e têm o apoio do agronegócio, é o ápice da tramóia que marca a história desse gênero musical imposto aos brasileiros na década de 1990.
Ninguém me contou. Eu vi.
À época, como subeditor e depois editor do caderno de cultura do Estado de Minas, acompanhei o investimento fabuloso que as gravadoras fizeram em Chitãozinho e Chororó, Leandro e Leonardo e Zezé di Camargo e Luciano, as três duplas mais famosas.
As emissoras de televisão recebiam fortunas para dar palco aos "amigos" nos programas do Faustão, do Gugu, da Hebe e outros apresentadores de menor destaque.
Nas rádios FM, o jabá era no varejo, na forma de mordomias e presentes para programadores e apresentadores.
Um suborno bilionário para enfiar nos ouvidos do público música de gosto duvidoso e salvar as gravadoras multinacionais, que passavam por uma grave crise financeira, com queda nas vendas de CDs e no faturamento.
O resultado dessa fraude musical deu tão certo que uma derivação agora é usada politicamente, para arrebanhar votos para os candidatos de direita, com shows financiados com recursos públicos desviados da população de municípios pequenos e pobres.
A cultura da música regional brasileira é a da dança da catira e da folia de reis, da viola de Tião Carreiro, da voz de Inezita Barroso (que repudiava com todas as forças o pastiche sertanejo) e dos causos e canções de Rolando Boldrin. São as gravações de Zé Coco do Riachão, o forró de Luiz Gonzaga, as composições de Raul Torres e Florêncio. É Tonico e Tinoco, é Elomar, é Bambico. Sem suborno e sem corrupção.
PS: se tenho um orgulho do período em que atuei no jornalismo cultural foi o de não ter cedido ao modismo dos shows dos "amigos", que vinham constantemente se apresentar em BH.
Os eventos eram noticiados seguindo as normas do bom jornalismo, mas sem abrir matérias e imagens de fora a fora na capa do caderno.
Era a mesma postura dos cadernos de cultura do Estadão, Folha, O Globo e Zero Hora, em um tempo em que o jornalismo não se furtava a reagir ao mau comportamento da indústria cultural.
Via João Souza, facebook.
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