quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

TEMPO DE PORCO E JUMENTO



Trilussa, grande filósofo, certa vez escreveu sobre o jumento e o porco.
Então, um dia, ambos se encontraram no matadouro.
Chegou primeiro o porco e lá ficou à espera da morte, pacientemente, até que chegou no outro dia o jumento que, ao dar de cara com o porco, começou a chorar, desanimado, mais de mil vezes apavorado, lágrimas caindo pelo chão igual chuva, tal qual ‘bezerro’ ou jumento desmamado.
Dizia o jumento:
- Adeus, meu amigo, meu irmão, não nos veremos mais, estamos no fim do caminho’.
E cada vez mais gemia e mais chorava e mais se desesperava o jumento, porque via o tal do porco totalmente calmo, tranqüilo, resignado, assim meio adormecido, mas meio que ‘dopado’, meio que ‘chapado’, como diz a rapaziada da hora.
Será que o porco estava esquizofrênico?
Seria o porco um retardado mental?
Dizem que o porco é meio filósofo e o porco da história foi logo tentando acalmar aquele jumento da seguinte forma:
- Estanca esse teu pranto e deixa de tolice. Adeus? Adeus por que? Porque morremos? Deixa que venha a morte. A morte é bela. Quem sabe ainda nos encontraremos no pedaço de alguma mortadela!
A filosofia do porco é algo assim como a verdade da nossa vida na terra.
Tem tempo certo para nascer, crescer, plantar, colher; tempo certo para planejar e mandar fazer; tempo certo para espreitar, fazer armadilhas e acionar botões; tempo de amar e desistir de fazê-lo; tempo de ter medo por ainda ser criança ou por ser covarde; tempo de construir uma casa para agasalhar os filhos e depois dividi-la em pedaços para não tê-los mais; tempo de fazer traquinagens na infância para ter do que se lembrar quando a velhice for iminente; tempo de viajar pelo mundo enquanto o bolso estiver permitindo essa delícia; tempo de dar carinho enquanto o corpo for capaz de ser despertado por desejos; tempo de não fazer nada, mas ser sozinho; tempo de buscar por remédios quando não houver mais nenhuma possibilidade de poder matar os estranhos e medonhos monstros que começam a habitar nossas cabeças; tempo de sentir orgulho, ter vaidade, expor beleza e mostrar luz, para depois cairmos no ostracismo; tempo de ser jovem, galante e bonito, para depois ser apenas um rastro composto de lembranças capengas e furtivas de uma vida que, embora comprovada, não terá crédito algum.
Contra a filosofia do porco, não adianta se rebelar.
Existe um momento na vida que todos nós vamos passar, que temos que passar.
Afinal, morrer é a coisa mais certa na vida.
Mas com certeza também no momento certo, isto é, depois que tivermos passado todos os tempos possíveis, aproveitados ou deixados para trás.
E você, tem feito o quê com o seu tempo de vida?
O que mais lhe falta viver?



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