Nos dias que correm, informar que o presidente da República foi internado e está num centro cirúrgico, sem que se sabia o que aconteceu, é uma irresponsabilidade
Por: Reinaldo Azevedo
Publicada: 25/10/2017 - 17:14
A repórter Andréia Sadi, da GloboNews, não teve dúvida. Entrou no ar, ao vivo, na Globo e na GloboNews, para informar com exclusividade — claro! — que “o presidente Michel Temer passou mal e está internado no centro cirúrgico do Hospital do Exército”.
Contexto: é o dia em que está prevista a votação, na Câmara, da segunda denúncia contra o presidente.
Contexto: não faz tempo, o presidente teve uma pequena obstrução coronariana, considerada sem gravidade.
Adivinhem o que aconteceu…
Lamento muito ter de escrever o texto que vai a seguir, mas não há jeito.
Andréia tem o seu blog em que publica títulos como este: “Temer assume balcão de negociações às vésperas da votação de denúncia”.
Ok.
Ela acha que é balcão? Perfeitamente.
Ocorre que o trecho forte do seu post, em que ancora o seu título, é este:
“Segundo o Blog apurou, o presidente orientou aos aliados que levassem a ele nesta terça os parlamentares indecisos, pois estará o dia todo à disposição para negociar, com o gabinete presidencial de portas abertas. Nas palavras de um interlocutor do presidente, o encontro foi um ‘mercado de votos’”.
Sigilo de fonte é sagrado.
Sei bem do que falo porque fui vítima de uma canalhice ou de membros da Polícia Federal ou do Ministério Público.
Não vou, portanto, perguntar quem é esse “interlocutor do presidente”.
Em existindo, interlocutor não é, mas inimigo.
No tempo em que jornalismo tinha edição, passei por algo assim.
Um repórter do gênero fuçador veio com um “off” de um “interlocutor do presidente” que simplesmente demoliria o governo FHC.
Eram tempos em que a responsabilidade impedia que saísse fazendo alarde sobre isso e aquilo sem que houvesse antes a devida confirmação da informação.
Disse com clareza: “Não é para tornar público, não! Viva a Constituição! Mas eu, que vou ter de responder adiante por aquilo que eu aceitar na página, quero saber: quem é a fonte”. O autor da matéria que não houve se abespinhou: “Tenho direito ao sigilo…” E eu: “Claro! E eu tenho o direito de não publicar. Se quiser, recorra aos chefes acima de mim”.
Não recorreu.
Mas não só. Tanto no caso dele como no de Sadi, há uma diferença entre jornalismo e fofoca. Naquele caso e neste, a matéria é outra. Sadi deveria evidenciar numa reportagem de fôlego, esta sim de alto interesse, que o presidente está cercado de inimigos. Aquele que se diz “seu interlocutor”, ou que ele pensa sê-lo, é um inimigo, certo? Foi o que disse àquele repórter à época: “Traga-me aqui os que conspiram contra FHC dentro do Palácio, e vou forçar, como deve fazer quem edita, para que a Secretaria de Redação dê manchete. O que você me traz, como está, pode ser uma plantação do PT. Ou pura e simplesmente uma invenção”.
Ele se zangou. Não aconteceu nada. Também não foi reclamar. A matéria não existia.
De volta à notícia do dia.
Quem passou a informação para Andréia não era, com certeza, um “interlocutor próximo” do presidente ou lhe teria dito que o presidente tivera um problema urológico, não coronariano.
As informações têm circunstâncias.
Num outro momento, vá lá: “O presidente foi para o hospital etc.” Nos dias que correm, levar tal informação ao ar, sem detalhe, é uma irresponsabilidade.
A imprensa, com as exceções de praxe, está perdendo os referenciais.
Sim, entrei no ar ao vivo, na BandNews FM e na Rádio Bandeirantes.
Depois de confirmar com três fontes.
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