A HISTÓRIA E AS IMAGENS ANTIGAS
- Orlando Pinheiro -
Tenho a impressão, senão quase certeza, de que o pessoal da minha cidade não é chegado em história, tanto que aqui ainda existe “estória”.
Ninguém é muito chegado à história de São Miguel Arcanjo e quem sabe a história nenhuma...
Preferem mesmo estória e causo bem contados.
Falo isso com conhecimento, porque há algum tempo criei no “facebook” uma página para inserir nela fotos antigas com legenda explicativa embaixo.
Pouca gente se interessou.
Julguei que a pequena informação logo abaixo da imagem se tornasse cansativa. Passei a divulgar só a foto contando local e época. Foi o mesmo chá de nem te ligo!
Percebi que até os anos 50 e 60, cujas imagens ainda estão na memória fotográfica, o povo gosta e se identifica.
Passou desse tempo, ninguém quer saber do que se trata, muito menos interessa quem é aquele homem sisudo de bigode e o que ele fez.
Um dia postei uma imagem de uma festa durante a construção da igreja onde haviam várias pessoas ao lado do padre.
Um cidadão associou os personagens a políticos e escreveu que eram “papagaios de pirata” aproveitando a oportunidade para se aparecer.
Não era nenhum político. Eram membros da diretoria pró construção da igreja.
O único palpite ainda foi infeliz e nem sequer bateu na trave. Quando houver dúvida é sempre certo perguntar para não atirar a esmo.
Resolvi postar fotos atuais e houve repercussão positiva.
As fotos da igreja em qualquer posição, de flanco, de viés, de cunhém e de farfôio causam um suspiro só...
Em todo mundo!
Ô gente!
São Miguel não é só igreja e rio Taquaral, não.
Tem mais de cento e vinte anos de história na esteira da construção desse pedacinho de chão.
Quem não estuda o passado para entender o presente, jamais conseguirá tracejar qualquer coisa para o futuro.
Se o estudante, o cidadão,o universitário se disporem a mergulharem, não só nas fotos históricas antigas e questioná-las, vão entender porque somos o que somos e porque ainda estamos onde estamos.
Por exemplo, muito se fala do prédio do cinema.
Creio que poucos se deram ao luxo de ler o livro do Miguel França de Mattos que descerra a história dessa modalidade de entretenimento na cidade, desde o começo do século XX.
Colocando pingo nos is e cortando os tês, é importante saber que a história estuda a vida dos homens e de determinada comunidade ao longo dos tempos.
É interessante saber quem foram os homens que sentiram, e o que pensaram para fazer uma São Miguel Arcanjo, antes um pequeno apêndice de Itapetininga até 1889.
E como foi que nós nos transformamos nestes seres sociais que habitam as plagas de dona Maximina e dona Teresa Augusta.
O conhecimento da história amplia a compreensão do ser humano enquanto pessoa que constrói o seu tempo.
E a introspecção na história nos ensina o que podemos ser e fazer para melhorar a cidade e o município.
Só pra lembrar: “A história é a ciência do passado e do presente e um e outro são inseparáveis”.
Admiro a disposição da minha amiga Luiza Válio e outros iguais à ela irmanados na preservação da identidade.
E porque não dizer, até da etnia, pois nos parece que ao longo desses anos estamos nos diferenciando dos demais seres gregários da sociedade ao derredor.
É importante contar aos que não se interessam pela história do município, que o passado não se repete em termos absolutos, por isso, soluções de antigamente não servem para mudanças atuais, mas colabora no processo de recriação das condições políticas, econômicas e culturais.
Voltando às minhas fotos antigas, eu pergunto aos meus botões: em que medida, esse tipo de trabalho que levou anos para ser resgatado serve para o homem entender o presente em que vive, muitas vezes escravo da sua própria situação sócio econômica; suas ideias e preconceitos para mergulhar no passado e trazer à tona um presente pleno de realizações?
Para muitos, o historiador é um ser sonhador.
Por mais que lute para evitar preconceito associado à cor, credo, classe social ou sexo, não há como evitar olhar o passado de um forma pessoal, pois sabe-se que lá nas entranhas das eras é que muitas coisas positivas ou negativas se solidificaram em nós e refletem diretamente a realidade que vivemos.
Só percebemos o mundo (São Miguel Arcanjo no meio), através de convenções estruturadas e estereótipos onde entrelaçamos várias culturas à outras.
As fotos antigas estão aí para mostrar isso.
Nem por isso, quem maneja a história é uma pessoa isolada do seu tempo e nem tampouco neutra.
Geralmente, a história que se escreve é a história que se vive... Que história estamos escrevendo para a geração vindoura? Será que daqui a cinquenta anos, quando o rodeio for uma realidade cibernética, os nossos trinetos vão olhar para a nossa realidade com cara de que que é isso?
Alegrias, lutas e sonhos refletem na reconstrução do passado.
Não podia deixar fora desta meditação o meu amigo Paulo Manoel.
Filho da terra, que ama seu pedaço de chão, ele vai mais além, debruçando sobre complicadas árvores genealógicas provando à todos nós, que como historiador, ele trabalha para seu tempo e não para a eternidade, sem pretensão de fixar verdades absolutas, visto que a história como ciência é uma atividade contínua de pesquisa.
Na verdade, iríamos além daquém observando as fotos antigas e atuais de São Miguel Arcanjo.
Pretendo voltar ao assunto (numa análise da nossa sociedade “alviceleste”através do tempo), mas o que fizemos até agora na página do “facebook” foi periodizar e demarcar tempos históricos com imagens significativas e apontar elementos que identificam o tempo demarcado.
O historiador, o antropólogo, o genealogista são mutuamente necessários.
Sem fatos, o historiador não tem raízes e torna-se vazio.
E o fato sem o historiador é um ente morto sem sentido algum. Um processo de interação entre o ontem e o hoje são diálogos de uma peça, que na maioria das vezes, constituem num grande final.
- matéria enviada para a minha página do facebook.
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