quinta-feira, 23 de abril de 2020

O IMBECIL QUE SE COMPARA A LUIS XIV

Paranoico e esquizofrênico, Bolsonaro é um imbecil que acredita ser a versão tropical e mal-acabada de Luís XIV.
Imagem20 de abril de 2020

(*) Ucho Haddad

Autoritário e, por consequência, ególatra, Jair Messias Bolsonaro insiste em apostar na política do confronto para levar adiante um governo que esfarela com o passar dos dias. 
A crispação sempre foi sua tática enquanto parlamentar. Foram 28 anos de desserviços à nação, período marcado por declarações polêmicas, ofensas gratuitas, devaneios descabidos, homenagens a torturadores. 
Tudo sem que o Parlamento tivesse reagido à altura para mandar de volta para casa um político que se alimenta no cocho da delinquência intelectual.
Paranoico, pois sempre que se vê em dificuldade recorre ao discurso de que algo está sendo tramado contra si, Bolsonaro é tão primário na encenação que chega a ser previsível. Primeiro disse que Rodrigo Maia e setores do STF estavam a arquitetar um golpe para derrubá-lo do poder, o que é sonoríssima inverdade. 
Na sequência, Bolsonaro surgiu na frente do quartel do Comando Geral do Exército, em Brasília, para saudar apoiadores ensandecidos que pediam um novo AI-5 e o fechamento do Congresso Nacional e do Supremo.
Na política, concordem ou não, cada passo, cada gesto, é prévia e minuciosamente calculado para que os objetivos sejam alcançados. 
Bolsonaro cuidou do preâmbulo da ópera bufa, deixando a organização do evento do último domingo, 19 de abril, para os fundamentalistas da extrema direita que o assessoram dentro e fora do Palácio do Planalto, sempre financiados com o suado dinheiro do contribuinte. 
Até porque, em meio à crise econômica que vem desde antes do surgimento do novo coronavírus, ninguém se arrisca a perder tempo com um boçal sem a devida contrapartida. 
É verdade que existe a súcia de abduzidos, mas aqueles que os comandam são regiamente remunerados.
Dissimulado por conveniência, até porque precisa da estupidez pontual para tentar escapar dos torvelinhos jurídicos, Bolsonaro alegou não ter cometido qualquer ilícito ao participar do protesto que aconteceu na capital dos brasileiros, já que em seu discurso tosco e détraqué mencionou democracia e manutenção das liberdades. 
Para quem exalta a memória de torturadores e ditadores, o conceito de democracia certamente foge à realidade.
Após carraspana do generalato palaciano, apesar de alguns militares terem colocado panos quentes, Bolsonaro rompeu esta segunda-feira com um palavrório distinto, procurando amenizar a afronta que protagonizou contra a democracia e o Estado de Direito. 
Como escreveu o poeta português Manuel Maria Barbosa de Bocage, “a emenda saiu pior do que o soneto”. 
Algo elementar, pois nada deve-se esperar de um totalitarista convicto movido pela ignorância.
O comportamento de Jair Bolsonaro é de tal forma torpe, que ele sequer cora a face quando se desdiz. 
Covarde, o presidente disse, à porta do Palácio da Alvorada, que no protesto do final de semana os pedidos de fechamento das instituições partiram de “infiltrados”. 
Se o presidente detectou que havia infiltrados na manifestação, que deixasse o local em respeito à democracia, à Constituição, ao Estado de Direito e aos Poderes constituídos.
Bolsonaro tem o direito de dizer o que bem quiser, inclusive o de mentir de maneira acintosa, mas precisa ter cuidado com as próprias palavras para que as contradições não o transformem em um mitômano irrecuperável. 
No protesto, o presidente declarou: “Nós não queremos negociar nada. Nós queremos ação pelo Brasil”. 
Não obstante, o presidente bradou “acabou a época da patifaria” e “agora é o povo no poder”. 
Lembre-se, caro leitor, que Hugo Chávez, o finado, adotou discurso semelhante.
Ora, se um governante se nega a negociar com o Parlamento, condição basilar de qualquer democracia, é porque está sugerindo a seus apoiadores que a única saída é a radicalização. 
Bolsonaro não tolera limites desde o tempo em que acabou expulso do Exército por transgressões graves.
Como se fosse pouco, Bolsonaro disse no domingo, enquanto discursava em meio à tosse, que lá estava por acreditar nos manifestantes. Se o presidente acredita nas pessoas que se aglomeraram diante do quartel do Exército, ato contínuo endossou os pleitos de um novo AI-5 e de fechamento do Congresso e do STF. 
Que ninguém leve a série o “dito pelo não dito” de Bolsonaro, já que sua gênese brotou no lodo do autoritarismo.
Para piorar o que há muito é ruim, Jair Bolsonaro, em mais um rompante típico de tiranete, disse aos jornalistas e apoiadores que estava à saída do Palácio da Alvorada: “O pessoal geralmente conspira para chegar ao poder. Eu já estou no poder. Eu já sou o presidente da República. Eu sou, realmente, a Constituição”.
Jair Bolsonaro precisa voltar ao banco da escola para aprender a diferença entre “ser” e “estar”, já que ele apenas está presidente da República, para a sorte grande dos brasileiros de bem. 
Em relação a conspirar para chegar ao poder, o presidente precisa apresentar provas sobre eventuais conspirações. 
É possível que, como sempre, não o faça porque ele próprio talvez tenha conspirado para chegar ao Palácio do Planalto.
No tocante à declaração de que ele próprio é a Constituição, Bolsonaro parece ter incorporado o espírito de Luís XIV, conhecido como “Rei Sol”, que durante 72 anos e quatro meses governou a França à sombra de teses totalitaristas.
A Luís XIV é creditada a célebre frase “L’Etat cest moi” (“O Estado sou eu”). 
Não se sabe ao certo se o regente francês de fato deu essa declaração durante sessão do Parlamento, mas a frase completa, que cai como fina luva sobre as pretensões de Bolsonaro, é: “Je suis la Loi, Je suis l’Etat; l’Etat c’est moi” (“Eu sou a Lei, eu sou o Estado; o Estado sou eu”).
Assim como Jair Bolsonaro, o centralizador e despótico Luís XIV acreditava na tese da origem divina do poder real. 
Não custa lembrar que presidente brasileiro afirma, vez por outra, que foi escolhido por Deus para governar o País. 
Como Deus é brasileiro, segundo o adágio popular, resta concluir que o Criador estava desatento ou perdeu o juízo de vez. (Que Deus me perdoe!)
Bom seria que alguém dissesse a Bolsonaro que ao ser empossado na Presidência ele assumiu o compromisso, sob promessa, de respeitar incondicionalmente a Constituição Federal. 
No momento em que o presidente vocifera a sandice de que ele é a Constituição, fica explícito que ele só está disposto a respeitar as próprias vontades.
Se Jair Bolsonaro não se importa com os opróbrios decorrentes de suas estabanadas declarações e atitudes, as autoridades deveriam se movimentar com celeridade e antecipação para impedir que, mesmo ainda sendo remota a possibilidade, ocorra o pior com a democracia e o Estado de Direito.
Insistindo nessa lufada Luís XIV que soprou sobre Bolsonaro na manhã desta segunda-feira, que o presidente da República dê sequência ao enredo histórico do regente francês, que no leito de morte teria dito: “Je m’en vais, mais l’État demeurera toujours” (“Eu saio, mas o Estado sempre permanecerá”).
O comportamento de Bolsonaro não me surpreende, já que há décadas acompanho as pilhérias de um tresloucado que sempre se mostrou apoplético diante da democracia e da liberdade.
Sei que a expressão a seguir é enfadonha, mas não posso me furtar de citá-la ao final deste texto: Eu avisei!

(*) Ucho Haddad é jornalista político e investigativo, analista e comentarista político, escritor, poeta, palestrante e fotógrafo por devoção.

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