domingo, 28 de junho de 2020

APRENDER A ESCREVER É DIFÍCIL. JÁ MATAR É TÃO FÁCIL...

Pedreiro condenado pela morte de Vitória Gabrielly manda carta ao pai da criança: 'Outros fizeram'.
Corpo da adolescente de 12 anos foi achado em 16 de junho de 2018, em Araçariguama. Um servente de pedreiro foi condenado em outubro de 2019 após júri popular; casal apontado por participação está preso aguardando julgamento.
Por Carlos Dias, G1 Sorocaba e Jundiaí/25/06/2020.


Vitória Gabrielly foi encontrada morta em Araçariguama — Foto: Reprodução/TV TEM.
O pedreiro condenado a 34 anos de prisão pela morte de Vitória Gabrielly, em junho de 2018, em Araçariguama (SP), enviou uma carta ao pai da criança. Após dois anos do corpo da adolescente encontrado na mata de Araçariguama (SP), a família tenta entender o assassinato da menina, aos 12 anos. Um casal réu ainda não foi julgado.
Em 8 de junho de 2018, a estudante saiu de casa para andar de patins e desapareceu. A vítima foi encontrada por um morador, no dia 16 de junho. Na época, o caso comoveu e a polícia chegou à conclusão que a menina teria sido morta por engano, ao ser raptada por conta de uma dívida de drogas e confundida com outra pessoal.
Na carta, a qual o G1 teve acesso com exclusividade, Júlio Ergesse, que está preso na Penitenciária de Tremembé, afirma que o amigo que o denunciou seria o responsável pelo crime e que o homem estaria foragido. Em outro trecho, ele afirma que não foi feita a perícia em um carro azul.
"Não é justo estar preso pelo que os outros fizeram", escreveu.


Carta a qual o G1 teve acesso foi enviada ao pai de Vitória — Foto: Arquivo.
O material chegou ao pai de Vitória, Beto Vaz, por meio de uma pessoa da cidade que estava presa na mesma unidade em que o pedreiro. A defesa do pedreiro não se pronunciou sobre a carta.
"Não vi uma palavra solidária, nem um boa noite ou pêsames. Não sei porque mandou. Só vejo uma versão se importando apenas com ele mesmo descrita aqui", diz Beto.
Segundo a Polícia Civil, os pontos citados por Júlio foram investigados durante o inquérito e não apresentaram nenhuma ligação com o crime.
Além de Júlio Ergesse, o casal Bruno Oliveira e Mayara Abrantes foi identificado pela polícia também como responsável.

'Trágica história'
"A gente se pergunta muito sobre quais as lições que ficaram nesses dois anos e a resposta é: frustração. Nenhuma lição, nenhum legado, como se não tivesse acontecido nada. Então, existe muita mágoa no coração da família de pai e mãe. Não digo revolta, mas tristeza. Era pra ter mudado. A gente ver ações. Vira estatística e uma trágica história", disse Beto ao G1.
A mãe de Vitória chegou a abrir uma ONG em nome da criança para atender os jovens da cidade e oferecer educação e espaço para brincadeiras, como a menina havia saído para andar de patins e não retornou.
"Está pronta, só não tem estrutura física, mas já está dando os primeiros passos", conta o pai.


Pai de Vitória Gabrielly com a filha — Foto: Arquivo Pessoal.
Com o Fórum fechado por conta da pandemia de coronavírus, o julgamento do casal deve ser realizado ainda neste ano, com a volta do processo à Comarca depois de negado o recurso no Tribunal de Justiça.
A defesa de Júlio também entrou com uma apelação no TJ para tentar um novo júri e anular a sentença do julgamento realizado em São Roque, em outubro.
Na ocasião do júri do pedreiro, antes de encerrar, o juiz Flávio Roberto de Carvalho afirmou que este caso foi o mais difícil em toda sua profissão.


Júlio Ergesse foi condenado a mais de 30 anos de prisão por morte de Vitória Gabrielly — Foto: Carlos Dias/G1.

O 1º júri
Júlio chegou ao Fórum às 8h57, pouco antes do início da audiência, que começou por volta das 9h30. Nove testemunhas foram ouvidas, entre elas, um amigo do servente, que relatou que foi procurado por ele três dias após a garota desaparecer.
“O Júlio estava alterado quando me procurou, muito nervoso. Dei água com açúcar e insisti para falar o que tinha acontecido. O Júlio disse que não sabia onde tinham deixado a menina. Me senti na pele dos pais da menina, mesmo considerando o Júlio um irmão”, contou a testemunha durante a audiência.
Ainda conforme a testemunha, ele e Júlio se falaram no dia 11 de junho de 2018, três dias depois da adolescente Vitória ter desaparecido. Conforme depoimento, a testemunha negou envolvimento dela no caso, disse que conhece o Júlio há 11 anos e que nunca brigaram.
Quem também iria falar sobre o trabalho da polícia seria o ex-chefe da investigação de Araçariguama Marcos Pereira Gomes, conhecido como Marcão.
No entanto, o policial morreu ao sofrer um infarto na academia, em São Roque, em abril deste ano. No lugar dele quem prestou esclarecimentos foi a delegada Bruna Racca.
A delegada disse que, com o uso dos cães farejadores, o Júlio não foi identificado no local onde o corpo foi encontrado.


Advogado da família da Vitória, morta em Araçariguama, atendeu a imprensa antes do início do júri em São Roque: 'Estamos confiantes na condenação' — Foto: Carlos Dias/G1.

Relembre o caso
Mayara, Bruno e Júlio foram presos acusados de participação direta na morte da menina. Os três estão na penitenciária de Tremembé, no Vale do Paraíba (SP). Eles já foram ouvidos pelas polícia e Justiça e negaram os crimes.
Vitória Gabrielly desapareceu na tarde do dia 8 de junho de 2018, quando saiu de casa para andar de patins, em Araçariguama.

Câmeras de segurança flagram garota antes de desaparecer em Araçariguama.
A adolescente foi encontrada morta oito dias depois, em 16 de junho, em uma mata às margens de uma estrada de terra, no bairro Caxambu.
Segundo a polícia, a garota estava com os pés e as mãos atados e o corpo amarrado a uma árvore. Vitória usava a mesma roupa que vestia no dia em que sumiu e os patins foram encontrados perto do corpo.
A morte da menina comoveu a cidade de Araçariguama, que se mobilizou para encontrá-la. Cerca de duas mil pessoas participaram do enterro no cemitério da cidade.
Dias depois, a Polícia Civil abriu um segundo inquérito para realizar buscas pelo suspeito de integrar a cúpula do tráfico de drogas na região e que estaria envolvido no crime. O homem foi preso meses depois com drogas. A investigação sobre ele corre em segredo.
Na época do crime, a polícia apurou que Vitória foi raptada por engano para que uma dívida de drogas fosse quitada. A menina teria sido morta depois que os criminosos perceberam que estavam com a pessoa errada.


Muitas pessoas acompanham o júri de Júlio Ergesse, acusado de matar Vitória Gabrielly em Araçariguama — Foto: Carlos Dias/G1.

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