Decreto presidencial de 2017 foi parcialmente suspenso por liminar.
O plenário do STF iniciou nesta quarta-feira, 21, o julgamento da ADIn 5.874, em que a procuradora-Geral da República, Raquel Dodge, questiona o decreto de indulto editado pelo presidente da República, Michel Temer, em dezembro de 2017.
Após a leitura do relatório pelo ministro Barroso, da manifestação da autora da ação e das sustentações orais dos amici curiae, o julgamento foi suspenso e deverá ser retomado na sessão da próxima quarta-feira, 28.
Histórico
Na ADIn, Raquel Dodge alega que a norma fere a CF ao prever a possibilidade de exonerar o acusado de penas patrimoniais e não apenas das relativas à prisão, além de permitir a paralisação de processos e recursos em andamento.
Poucos dias depois da publicação do decreto 9.246/17, a ministra Cármen Lúcia deferiu medida cautelar para suspender os efeitos de dispositivos impugnados do decreto, que reduziram o tempo de cumprimento da pena para fins de concessão do chamado indulto de Natal. “Indulto não é e nem pode ser instrumento de impunidade”, afirmou a ministra na decisão.
Em fevereiro de 2018, o ministro Barroso, manteve a liminar concedida por Cármen. Em março, em nova liminar, Barroso liberou a aplicação de parte do indulto de Temer. A nova decisão alterou pontos da liminar anteriormente concedida, permitindo a aplicação em parte do decreto nas hipóteses em que não se verifica desvirtuamento na concessão do benefício e mediante os critérios nela fixados.
Requerente
Na avaliação da PGR, o decreto viola, entre os outros princípios, o da separação dos Poderes, da individualização da pena, e da vedação constitucional para que o Poder Executivo legisle sobre Direito Penal. Sustentou ainda a violação ao princípio da moralidade administrativa, na vertente do desvio de finalidade.
“Uma medida dessa natureza interfere diretamente com a jurisdição penal, com seus efeitos, e tem reflexos diretos na confiança e na credibilidade do sistema de administração de Justiça”, disse na sessão desta quarta-feira.
A competência para conceder indulto, segundo a procuradora-Geral, não tem caráter absoluto nem ilimitado e não confere ao presidente da República a prerrogativa de suprimir injustificadamente condenações penais. “O chefe do Executivo não tem competência constitucional para legislar sobre matéria penal e não pode, por essa razão, extrapolar os limites da finalidade do indulto e estabelecer parâmetros incompatíveis o princípio da razoabilidade.”
A concessão de indulto, em se tratando de exercício de função excepcional, deve se fundar em critérios de política criminal, compatíveis com a natureza humanitária do instituto, explicou Dodge. Para ela, esse não é o caso do decreto impugnado. “Sem justificativa minimamente razoável, o decreto amplia desproporcionalmente os benefícios e cria um cenário de impunidade no país. Reduz em 80% o tempo de cumprimento da pena aplicada, extingue penas restritivas de direito e suprime multas e o dever de reparar o dano pela prática de crimes graves.”
Além disso, para a procuradora-Geral, os dispositivos são anômalos se comparados a decretos de anos anteriores. “Houve o intuito inequívoco de alcançar condenados por crimes contra a administração pública (corrupção e peculato), os quais não vinham sendo beneficiados de forma tão generosa em anos anteriores.”
Amici curiae
Da tribuna, em nome da AMB, o advogado Alberto Pavie Ribeiro reafirmou os argumentos da procuradoria-Geral pela procedência da ação. Defendeu ainda que o limite para a concessão do indulto seja a pena mínima prevista em lei e que o benefício não seja aplicado aos beneficiados com a colaboração premiada.
Para o defensor público-Geral Federal Gabriel Faria Oliveira, que representou a DPU, politizou-se a concessão do indulto por conta da operação Lava Jato. De acordo com ele, dos 22 condenados em decorrência da operação, apenas um seria alcançado efetivamente pelo indulto. Além disso, argumenta que o STF já tem jurisprudência no sentido da competência discricionária do presidente da República para editar decreto de indulto. “A flexibilização agora permitiria a flexibilização outrora. Se o STF flexibilizar o decreto, a todos os decretos futuros haverá contestação judicial”.
Pela Defensoria Pública do Estado do RJ, o defensor Pedro Paulo Lourival Carriello também lembrou que o STF já discutiu essa matéria no julgamento da ADIn 2.725, quando se afirmou que a edição de um indulto não pode ser considerado ofensivo ao direito social à segurança.
Segundo Alessa Pagan Veiga, que falou em nome da Defensora Pública do Estado de MG, não procede que o indulto de 2017 seja mais generoso, menos criterioso e mais abrangente, como defende a PGR. Quanto às penas restritivas de direitos, por exemplo, alega que ele é igual aos anteriores. “Em alguns pontos ele é extremamente mais restritivo que os outros. Foi mais benéfico para crimes sem violência e sem gravidade, levando em conta o crescimento da população carcerária.”
O representante do IBCCRIM, Maurício Stegemann Dieter, defendeu que o indulto, ao contrário do que diz a requerente, não inova em matéria penal. “Considerando que se trata de um mecanismo de política de freios e contrapesos, vai incidir sobre matéria penal, mas não há nenhuma inovação legislativa nem cria normas penais completas ou incompletas.”
O advogado Marcelo Turbay Freiria, representante do Instituto de Garantias Penais - IGP, rememorou que o Supremo, no julgamento da ADPF 347, estabeleceu como medidas para abrandar a situação de “miserabilidade” do sistema penitenciário brasileiro a adoção de penas alternativas à prisão e outras que viessem a abrandar os requisitos temporais para fruição de benefício e direitos dos presos, como progressão de regime, livramento condicional e suspensão condicional da pena.
Por fim, em nome do Instituto de Defesa do Direitos de Defesa - IDDD, o advogado Fábio Tofic Simantob alegou que a questão trazida pela ação não tem natureza constitucional, uma vez que o indulto não está previsto na Carta de 1988, mas em lei infraconstitucional.
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