De nada adianta se indignar depois da lama derramada.
Por Redação Ucho.Info/
26 de janeiro de 2019
(*) Ucho Haddad
Tenho asco de hipócritas que, como carpideiras de plantão, têm se esforçado para avançar no terreno do politicamente correto e, desde ontem, passaram a entupir as redes sociais com mensagens relacionadas à tragédia de Brumadinho, em Minas Gerais.
Estão a derramar em suas postagens lágrimas crocodilescas, como se dentro de alguns meses o episódio não terá caído na vala do esquecimento.
Até a manhã de sexta-feira, 25 de janeiro, muitos desses falsos chorosos sequer sabiam onde ficava Brumadinho, palco de destruição provocada pelo rompimento de uma barragem de responsabilidade da mineradora Vale.
A sanha moralista que reina no País é tão escandalosa, que chega a provocar náuseas, gastura, repulsa e outros quetais. Muitos afirmam que não foi acidente, mas crime.
Outros pedem a prisão dos responsáveis.
Pelo que sei, o Brasil não é um amontoado de videntes, assim como ainda não é uma ditadura que dispensa leis para mandar prender.
Ou seja, muita calma nessa hora.
Deixem a bola de cristal onde está e guardem a palmatória.
O pior de tudo é que tem especialista em Direito defendendo a prisão dos responsáveis pela tragédia, sem ao menos identificá-los.
É o tal do juízo de valor antecipado, talvez reflexo dos minutos de fama indireta, algo comum entre os anormais, espécie em abundância na Banânia.
Se Freud não explica esse devaneio comportamental, por certo Andy Warhol seria capaz de explicar com sua teoria dos quinze minutos.
Até a manhã de sexta-feira, defender o meio ambiente era coisa de comunista.
Aliás, adequando ao tosco linguajar bolsonarista, era mais um ingrediente do marxismo cultural.
Talvez continue sendo no pensamento de alguns integrantes dessa notável e competente equipe de governo.
Nada que um confortável divã do psiquiatra da esquina mais próxima e algumas caixas de “tarja preta” não resolvam.
Tudo muito bem…
A tragédia de Brumadinho ficará fincada no noticiário por mais alguns dias, pois o ser humano regozija-se diante do calvário alheio.
Além disso, rende audiência aos veículos de comunicação e ajuda a salvar um garoto de 38 anos flagrado pelo Coaf por movimentações financeiras nada republicanas e na mira da Justiça por suas perigosas ligações com milicianos cariocas. Alguém há de dizer que trata-se de insensatez de minha parte, já que a lama da barragem soterrou centenas de vidas, mas é preciso questionar quantas vidas a corrupção e a milícia ceifam diariamente.
Sem falar na lama que escorre por debaixo da porta de alguns gabinetes.
De uns tempos para cá, o conceito de bom jornalismo foi pelos ares.
Bom jornalista, agora, é aquele que se dedica a demolir a esquerda a qualquer preço, ao mesmo tempo em que eleva um estúpido ao panteão dos heróis nacionais, como se Jair Bolsonaro fosse um clone de Aladim, o folclórico gênio da lâmpada maravilhosa.
De uns tempos para cá, bom jornalismo é aquele que fecha os olhos para as bizarrices direitistas, não sem antes minimizar as seguidas estultices do presidente e seus rebentos. Bom jornalista, agora, é aquele que se dedica a chamar os corruptos petistas de ladrões, mas passam a mão na cabeça dos corruptos e os condenados que integram o governo atual. E quem não fizer isso que vá pra Cuba que o pariu. Assim caminha a democracia nos domínios de James Bond de Pindorama.
Cá não estou a defender a esquerda nem a demonizar a direita, e vice-versa, pois não envergo qualquer abadá ideológico, assim como não tenho político de estimação, algo que já provei e comprovei ao longo de anos de jornalismo independente. Porém, o pau que bate em Chico, bate em Francisco, na alegria e na tristeza.
A estupidez que tomou conta de parte da sociedade roda em alta velocidade, como se torvelinho fosse, transformando Bolsonaro em um ser tauromáquico capaz de enfrentar todos os desafios, até ser vencido pelas banderilhas do populismo barato.
Tanto é assim, que movidos pelo binarismo do pensamento, seus aduladores divulgam nas redes sociais que Dilma demorou cinco dias para ir a Mariana, ao passo que o Sassá Mutema de quepe foi a Brumadinho dia seguinte.
Quando um político depende do petismo para justificar seus atos, é porque sua incompetência é maior do que se imaginava.
Voltando a Brumadinho…
Enquanto os brasileiros chafurdavam no cocho da fanfarronice política, com o intuito de colocar o País nos trilhos do autoritarismo e do retrocesso, dedicava-me, como jornalista, a denunciar a lama que ziguezagueou por muito tempo no Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), órgão que era vinculado ao Ministério de Minas e Energia e responsável, em tese, por gerenciar o setor minerário nacional. O que na prática não acontecia de maneira ortodoxa, como manda a lei e a boa governança.
Muitas foram minhas denúncias (desde 2016) sobre os escárnios no DNPM, a ponto de causar momentos de extrema preocupação aos então ocupantes do Palácio do Planalto, que em diversas ocasiões foram obrigados a recuar. As denúncias também despertaram o interesse de parlamentares em relação à criação de uma CPI para investigar o caso, mas o assunto perdeu força na seara política, já que, como é sabido, nas entranhas do poder o tilintar do vil metal cala vozes.
Em suma, fiquei a falar sozinho, mas com a certeza do dever cumprido.
Por nada e por ninguém abrirei mão de fazer o jornalismo que sempre fiz – e continuarei fazendo –, até porque jamais permitirei que poderosos me intimidem, nem seus prepostos insanos e desvairados, como os de agora, mas repudio as pesarosas (sic) manifestações que ora invadem as redes sociais, como se ninguém tivesse alertado para os fantasmas que rondavam e ainda rondam a mineração nacional. Em outras palavras, há muitas Marianas e muitos Brumadinhos na fila.
Quando leio e ouço que é preciso dar tempo a um governo trôpego que mal começou, apenas entrego-me às gargalhadas, não sem antes lamentar pelo burro circunlóquio usado para defender alguém indefensável.
Quando leio e ouço que critico o atual presidente porque “perdi a boquinha”, apenas entrego-me às gargalhadas, não sem antes lamentar pelo pensamento enxundioso de quem se acostumou ao efeito manada e acredita ser o dono da verdade suprema.
(*) Ucho Haddad é jornalista político e investigativo, analista e comentarista político, escritor, poeta, palestrante e fotógrafo por devoção.
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