quarta-feira, 27 de junho de 2012

ORGULHO DA CIDADE.



O maior maestro de todos os tempos que São Miguel Arcanjo possuiu chamava-se Joaquim Ortiz de Camargo. Seu filho João Ortiz, que o sucedeu no cargo, contava sobre o pai:

" Bem, o JOAQUIM MAESTRO, meu pai, chegou em São Miguel Arcanjo em 1.934. A gente morava em Itapetininga e, nos últimos dias de dezembro de 1.933, apareceu em casa um senhor de estatura pequena, físico franzino, mas muito vivo no jeito de falar. Ele gesticulava sempre e se erguia nos calcanhares, como se quisesse ficar mais alto.
O nome dele?
BENTO FRANÇA, que neste momento, enquanto eu falo com vocês, está com seus 86 amos, forte como cerne de caviúna.
O BENTO FRANÇA foi falar com meu pai. Queria que ele organizasse uma nova banda de música em São Miguel Arcanjo. Meu pai concordou. No dia dois ou três de janeiro, não me lembro bem agora, do ano de 1.934, JOAQUIM ORTIZ DE CAMARGO, o JOAQUIM MAESTRO, chegava à cidade que ele adotaria para sempre. Nós, os seus filhos mais velhos, também nunca mais saímos daqui.
Meu pai, o JOAQUIM MAESTRO, foi morar num casarão antigo, ao lado direito da antiga Igreja Matriz. Ao lado, também ficava o Mercado Municipal e, numa das das suas salas, meu pai começou a ensinar música aos rapazes de São Miguel Arcanjo.
Logo apareceram muitos alunos. Os rapazes aqui da cidade estavam entusiasmados com a oportunidade de aprender música.
Entre os primeiros alunos, me lembro do RENATO CAUCHIOLI (que toca nas maiores orquestras do Brasil), do Antonio Haddad, do Adib Miguel, do Rachid Elias, do Paulino Rodrigues. O Paulino tinha uma capacidade incrível de execução e, por isso mesmo, mereceu o instrumento mais difícil da banda, a REQUINTA. Com seis meses de aula, o Paulino lia e dividia com um desembaraço surpreendente. Pena que ele tenha abandonado a música muito cedo.
Os dias foram passando e com a colaboração de alguns músicos antigos, de outras bandas anteriores, logo a turma de Joaquim Maestro já pôde se apresentar.Me lembro de que o primeiro dobrado que meu pai compôs e que nós tocamos vinha com o nome de "BENTO FRANÇA". Uma homenagem a quem fazia renascer a banda.
Com o entusiasmo dos alunos, que estudavam com interesse as lições do meu pai, a banda foi melhorando cada vez mais. Chegou a um ponto em que já se podia ensaiar algumas óperas. Foi um grande sucesso quando a banda pôde executar no coreto da praça as óperas "Nabucodonozor" e "Sonho Dorati".
Até essa época, o entusiasmo era contagiante entre os músicos. Mas toda banda tem uma diretoria e toda diretoria acaba se esquecendo de seus deveres.
A época áurea chegava ao fim.
A banda foi reorganizada diversas vezes e por diversas vezes surgiram intrigas, disque-disques; meu pai, o JOAQUIM MAESTRO, acabou se desgostando e se despediu da banda na posse do prefeito Antonio Ferreira Leme. Foi a última vez que dirigiu os músicos.
Depois do meu pai, veio o EDMUNDO CACCIACARRO. Um maestro muito competente. Mas ele teve a mesma sorte que meu pai.
Nova tentativa foi feita com o maestro ANTONIO GUIMARÃES, o NENZINHO, como era chamado. O Nenzinho conseguiu reorganizar a banda em seis meses, fez algumas apresentações, mas depois foi embora sem dizer por que.
PEDRO ALVES foi o maestro sucessor de NENZINHO. Mas também ficou pouco tempo. Ele deixou a banda porque não recebia o pagamento, era uma coisa assim de 60 mil réis por mês. É que o PEDRO ALVES precisava desse dinheiro. Vivia com esse salário, não tinha outro trabalho. Como não pagavam, foi embora. O Prefeito, na época, era o Antonio Fogaça de Almeida, o Cirico.
A nova tentativa aconteceu comigo. Passei a reger a banda por insistência de Cirico. Mas se não pagavam o Pedro Alves, eu, muito menos.
Só recebi meus salários dois anos depois, quando a corporação musical ganhou diretoria nova.
A banda veio até 1.973, caindo aqui, levantando ali, até que parou de uma vez.
Agora., fiquei sabendo que existem pessoas que ainda gostam de música em nossa cidade. E que existe até um movimento para a formação de nova banda.
Deus queira que seja verdade.
São Miguel não pode ficar sem ela.
Afinal, banda é uma das nossas mais antigas tradições.
Vem desde os tempos do Tenente Urias. Isto é: desde 1.800".

OBS: O Maestro Joaquim Ortiz de Camargo nasceu em 09 de setembro de 1.890 e faleceu em 02 de maio de 1.964, e hoje empresta seu nome a um logradouro público da cidade.

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