domingo, 29 de junho de 2014

" O OURO E O CARVÃO "

O luzente metal, o rei do mundo,
Ao carvão disse um dia:
- Como lastimo, ó mineral imundo,
O teu destino e baixa serventia!
À gente que se preza és odioso;
Se alguém te pega, logo se enxovalha.
Ah! que emprego formoso:
Ser para a fornalha.

Mais liberal comigo foi a sorte:
Me adora o grande, almeja-me o pequeno
E até da própria morte
O horror encobre o meu fulgor sereno.
Do santuário as galas abrilhanto,
Do solo avulto a natural grandeza:
Converto em riso o pranto
E em virtude a torpeza.

Sou eu a luz das opulentas  salas
Onde tine o cristal das finas taças:
Rivalizo do sol com os fulvos raios
Do joalheiro nas nítidas vidraças!
Sou das damas o enlevo e a ternura,
Forjo do amor a mais aguda seta:
Sem mim a formosura
Não se julga completa!

- Basta, diz-lhe o carvão, ouro vaidoso,
Assim te fez agente;
O metal te chamando precioso
Como se fora mérito o acidente!
És o senhor do mundo, na verdade.
Serves ao luxo, serves á vaidade,
E um non-plus-ultra julgas-te afinal.
Mas se algum dia se esgotar na terra
O veio rico e louro que te encerra,
Não vai nisso algum mal!

Negro, como me vês, sou necessário,
E mais serviço presto à humanidade
Do que tu, deus inútil do usurário:
Entra e vê: na cidade,
Ferve o rumor e a faina do trabalho,
Ergue-se o fumo em rolos ondeantes.
Sou eu que forjo o malho
E o braço novo às fábricas possantes!

Eu da indústria os agentes alimento,
Dou asas ao vapor, que em ligeireza
Excede ao próprio vento;
E se queres mais força de nobreza,
De mim se gera o máximo portento,
A rainha das pedras - o diamante!

Julgas-me vil ainda, ouro arrogante?

Santa Helena Magno.

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