sexta-feira, 19 de abril de 2019

A MANHÃ DE 18 DE ABRIL LEVOU A JORNALISTA CECÍLIA THOMPSON

1936/2019

18.abr.2019 | 11:11h

Cecília Thompson com os filhos, Paulo e Flávio Guarnieri / Acervo pessoal

Cecília Thompson se foi.
Mãe de Flávio e Paulo Guarnieri, orgulhava-se de suas crias e de tê-las feito com o grande Gianfrancesco Guarnieri, de quem se separou a certa altura da vida, mas a quem visivelmente nunca deixou de amar.
Em dois minutos de conversa, todo novo interlocutor da Cecília ficava sabendo que ela era ex-mulher do Guarnieri, mãe do Flavinho e do Paulinho, os meninos do seu coração.
Trabalhamos juntas na redação do Estadão por 14 anos, se não me engano. 
Atriz e jornalista, ela esteve a serviço da família Mesquita por 34 anos, era quase uma lenda vinda desde os tempos do prédio da Major Quedinho, encerrando seus préstimos ao clã quatrocentão no bairro do Limão, que ela conheceu desde o primeiro tijolo.
Afiada e afinada com a dramaturgia, adorava vir comentar novelas comigo e com as meninas do caderno de TV. Compartilhava algumas mensagens que dividia com os velhos amigos para falar das produções em andamento na tela. Opinava, argumentava e sustentava um repertório de larga memória afetiva e intelectual.
Depois que ela deixou a redação, nos falamos ainda por algumas poucas vezes, mas sempre demoradamente. Trocamos outras ideias via Facebook. Há um ano, quando Caco Barcellos me contou que tinha uma jornalista de 83 anos colaborando com o seu pluralista “Profissão Repórter”, fui surpreendida pelo seu nome, comemorei e fiz aqui um post sobre isso. Ela ficou em êxtase. Só me ligou para corrigir que ainda não tinha 83, só 81, e corrigi.
Desde que Flávio morreu, há três anos, Cecília entrou num processo de tristeza profunda. Era uma dor que, fazia questão de dizer, o tempo não arrefecia de modo algum.
Cecília se foi hoje cedo, sem que eu tivesse retornado seu último telefonema. Que pesar eu sinto em não ter parado para fazer isso.
Ela gostava de falar, e falou com o Marcelo e o Antonio, aqui em casa, deixando textualmente esse recado ao marido: “Pede pra ela me ligar porque eu quero me despedir: estou morrendo”. Não é que eu não tenha acreditado. Na hora, disse: “Claro, vou ligar!”
Mas os telefonemas com a Cecília precisavam de tempo. A prosa não era rasa, longe disso, vinha toda trabalhada em boas histórias, argumentos, reflexões e bons pensamentos. Fui esperando pelo momento certo para falar com calma.
Deixei passar e deixei passar. Há poucos dias, ela me deixou um recado público no Facebook, dando parabéns pelo meu aniversário e reclamando que eu não havia ligado.
Agora, sou surpreendida pela notícia de que eu, uma pessoa cronicamente atrasada em tudo, me atrasei irremediavelmente dessa vez.
Só me resta rezar para que as almas fiquem a orbitar por aqui durante algum tempo, espiando as homenagens que os vivos lhes prestam. Como eu queria ter ligado, Cecília! Juro que queria. Perdi o prazo, não achei que sua partida fosse para já. Perdoe-me, se puder…

(Abaixo, o relato sobre a participação dela na equipe do “Profissão Repórter”)
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Cristina PadiglioneCristina Padiglioni/ Folha de São Paulo.

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