domingo, 2 de junho de 2019

É PERMITIDO QUE UM PRESIDENTE DA REPÚBLICA ABRA A BOCA PARA FALAR O QUE BEM QUISER?

'O Estado é laico', diz Marco Aurélio sobre Bolsonaro cogitar escolher evangélico para o STF. 
Ministro ponderou que fala do presidente foi 'arroubo retórico' permitido pela liberdade de expressão.
Carolina Brígido



O ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal Foto: Ailton de Freitas / Agência O Globo / 21-3-18

BRASÍLIA – O ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal ( STF ), lembrou nesta sexta-feira que o Estado é laico – e a Corte, como parte do Estado, não poderia ser formada segundo critérios religiosos. Para o ministro, os integrantes do tribunal devem ser escolhidos pela a formação jurídica e a defesa da Constituição Federal. A declaração foi em resposta ao presidente Jair Bolsonaro que questionou em discurso se não era o momento de se nomear um ministro evangélico para o tribunal.
— Não sabemos se alguém professa Evangelho. Temos católicos e dois judeus (Luiz Fux e Luís Roberto Barroso). Mas o importante é termos juízes que defendam a ordem jurídica e a Constituição. O Estado é laico. O Supremo é Estado — disse o ministro.
Entretanto, Marco Aurélio não criticou a fala de Bolsonaro. Considerou o discurso um “arroubo de retórica”, parte do direito à liberdade de expressão.
— Foi a visão dele, potencializando o lado religioso. Foi um discurso, um arroubo de retórica, algo permitido numa democracia, em que é assegurada a liberdade de expressão — ponderou.
Recentemente, Bolsonaro anunciou que a próxima vaga do STF, esperada para o fim de 2020, será preenchida pelo ex-juiz Sérgio Moro, hoje ministro da Justiça.
— Não se sabe se ele é evangélico, mas quem sabe? Talvez ele se converta agora — brincou Marco Aurélio.
Bolsonaro fez a observação quando se referia ao julgamento sobre a criminalização da homofobia. 
Seis dos onze ministros já votaram a favor. 
O presidente considera que o placar demonstra vontade do Judiciário para legislar. Marco Aurélio ainda não votou. Mas, durante as discussões em plenário, ressaltou que é tarefa do Congresso Nacional criar lei específica para punir a homofobia.
— Eu pincelei nos debates a impossibilidade de o Supremo legislar. Mas, nesses tempos estranhos, tudo é possível. De tédio a gente não morre — declarou.
Nas pautas relativas a costumes, o STF tem decidido a favor das minorias. Muitas vezes, essas decisões contrariam conservadores – hoje representados pela pauta do Palácio do Planalto. Para Marco Aurélio, não haveria problema em dividir a bancada com colegas mais conservadores.
— Em termos de costumes, há o somatório de forças distintas, as divisões diversificadas são bem-vindas. Sou católico. Agora mesmo vamos ter o batizado da minha neta. Mas não sou de frequentar a igreja toda semana, porque a dinâmica do meu trabalho é muito forte — disse, completando:
— No STF, o importante é professar a observância da Constituição Federal, a lei das leis. Amá-la e torna-la prevalecente.

O Globo.

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