quinta-feira, 19 de julho de 2012

E O OTIMISMO DOS ADVOGADOS?


Por que não há justiça no Brasil 


Claudio Weber Abramo 

O fator predominante no resultado da aplicação da justiça no Brasil é o poder econômico das partes. Qualquer que seja o ângulo com que a questão seja analisada, o resultado é sempre um favorecimento brutal de quem tem mais dinheiro. Os códigos processuais brasileiros propiciam um número imenso de oportunidades para que partes interponham recursos e atravanquem processos. De acordo com um levantamento feito alguns anos atrás pelo jornal carioca O Globo, um processo que corra do começo ao fim, percorrendo todas as instâncias da justiça estadual, chegando talvez a alguma instância federal, admite mais de 80 diferentes maneiras de interromper o curso processual. É claro que diversas delas são perfeitamente razoáveis e exigíveis em qualquer sistema jurídico. Grande parte, porém, é de formalidades perfeitamente contornáveis caso o princípio predominante fosse o da racionalidade. 

Racionalidade é a última coisa que se detecta nos códigos brasileiros. Não é de admirar, pois eles foram escritos por advogados de defesa. 
Para conduzir um processo da forma entrecortada e cheia das firulas perfeitamente kafkianas que testemunhamos, é necessário pagar advogados. Quanto mais detalhes recônditos o advogado é capaz de explorar, mais tempo ele conseguirá ganhar para seu cliente. Advogados assim custam caro. Quem pode pagá-los é a classe dominante. Em particular, corruptos que são levados à Justiça (o que já é raro) costumam ter bastante dinheiro para isso. Em processos criminais, a ideia é procrastinar até que o crime prescreva. Em processos cíveis, até que a parte contrária se esgote. É por isso que processos chegam a se arrastar por décadas. 
Já o sujeito que cometeu uma infração menor, como furtar uma peça de automóvel ou algo assim não pode pagar esses advogados. Este vai para a cadeia num piscar de olhos. Prova-o o fato de que uma grande parte dos processos que correm em primeira instância nos tribunais de Justiça não têm a decisão contestada, e não vão à segunda instância, porque os réus não têm como pagar. 
Outro fator importante que responde pela ineficiência do Judiciário é a quase completa opacidade administrativa atrás da qual ele se protege. Em sua quase totalidade (há umas exceções aqui e ali), os Tribunais de Justiça e as cortes superiores não se dão ao trabalho de medir minimamente seu próprio desempenho. Como não coletam sistematicamente informações a respeito de tempos médios de tramitação de processos (para ficar só com isso de uma lista que poderia estender-se), não se consegue estabelecer comparações entre varas ou entre magistrados. 
Um ministro de tribunal superior pede vistas a um processo e senta-se sobre ele por anos. Onde está a lista desses processos? Se existe, é mantida cuidadosamente escondida. É claro que isso só alimenta as suspeitas de que ministros enrolam porque são comprometidos com algum interesse, político ou econômico. A melhor maneira de provar que não é assim seria medir indicadores de desempenho e torná-los públicos. Se não o fazem, é porque tem motivos para isso, dando assim liberdade para que conjecturemos o que quisermos. 
Fazer justiça não é exatamente o ponto da Justiça brasileira.


OBS: Claudio Weber Abramo é diretor executivo da Transparência Brasil, 
entidade voltada para o combate à corrupção no país.

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