quarta-feira, 3 de dezembro de 2014

A FILHA INDESEJADA DOS FREUD

No dia de hoje, o Google faz homenagem a uma pessoa que não conheço, que nunca ouvi falar.
Talvez por interessar-me pouco, muito pouco por Psicologia, Psicanálise, matérias que, dizem, entendem com clarividência todo aquele mundinho que fica perdido lá por dentro das pessoas.
Não sei...
Lá do Núcleo Brasileiro Pesquisas Psicanalíticas, trouxe a biografia da então desconhecida para mim, 
ANNA FREUD.
Nascida no dia 03 de dezembro de 1895, Anna era a mais jovem dos seis filhos de Sigmund e Martha Freud. 
Anna não fora desejada nem por sua mãe, nem por seu pai, que decidiu, depois de seu nascimento, permanecer casto por não poder utilizar contraceptivos.
Anna teve de lutar para ser reconhecida pelas qualidades de que dispunha: coragem, tenacidade e o gosto pelas coisas do espírito. 
Não tendo nem a beleza de sua irmã Sophie Halberstadt nem a elegância de Mathilde Hollitscher, sentia-se em estado de inferioridade na família, na qual se esperava que só os herdeiros masculinos fossem talentosos para os estudos.
Rivalizando desde a infância com sua tia Minna Bernays, passou a adolescência invejando a doutrina que a privava de seu pai adorado. 
Na idade adulta, para aproximar-se dele, decidiu entrar para o círculo de seus discípulos. Mas como estava impedida de ir para universidade estudar medicina, tornou-se professora primária. Exerceria essa profissão durante toda a Primeira Guerra Mundial, de 1914 a 1920 exatamente.
Depois da morte prematura de Sophie e do casamento de Mathilde, Anna Freud tornou-se a Antígona da casa paterna, ao mesmo tempo discípula, confidente e enfermeira. 
Quanto a Freud, não hesitou em analisá-la por duas vezes: entre 1918 e 1920 e entre 1922 e 1924 (Não era anômalo para um pai analisar sua própria filha naquele momento, antes de qualquer ortodoxia tivesse sido estabelecida). Dez anos depois, tentaria justificar sua decisão: “Com minha própria filha tive sucesso, com um filho têm-se escrúpulos especiais.” 
Em 1920 Anna e Freud assistiram ao Congresso Internacional de Psicanálise e foi no campo da psicanálise de criança que Anna Freud ingressou no movimento. Em 1922, apresentou à Wiener Psychoanalytische Vereinigung (WPV) um primeiro trabalho, intitulado “Fantasias e devaneios diurnos de uma criança espancada”. Cinco anos depois, publicou sua obra principal, “O tratamento psicanalítico das crianças”. Paralelamente, assumiu a edição das obras do pai, “Gesammelte Schriften”, concluída em 1924. No ano seguinte, foi eleita diretora do novo instituto de psicanálise de Viena, recém-criado. 
Assim, começou a assumir as responsabilidades institucionais que iriam fazer dela a grande representante da ortodoxia vienense, em uma época em que Melanie Klein, sua terrível rival, começava a grande reformulação teórica da obra freudiana. Entre essas duas mulheres, representantes de duas correntes divergentes no seio da Internacional Psychoanalytical Association (IPA), entendimento algum nunca seria possível.
Após o ingresso de Anna no campo psicanalítico, teve em comum com o seu pai o trabalho e os amigos. 
Uma amiga comum era a escritora e psicanalista Lou Andreas-Salomé que era o confidente de Nietzsche e Rilke e quem iria se tornar o confidente de Anna Freud nos anos vinte. 
Através de Freud conheceu também Rilke cuja poesia que Anna Freud grandemente admirou. Os interesses literários de Anna pavimentaram o modo para a carreira futura dela.
Cercada pelos mais notáveis discípulos vienenses da primeira hora, Siegfried Bernfeld August Aichhorn, Wilhelm (Willi) Hoffer (1897-1967), Anna criou em 1925 o Kinderseminar (Seminário de Crianças), que se reunia no apartamento da Berggase. Depois das experiências infelizes de Hermine von Hug-Hellmuth, tratava-se então de formar terapeutas capazes de aplicar os princípios da psicanálise à educação das crianças.
No mesmo ano, conheceu Dorothy Burlingham, que se tornou sua mais cara amiga por toda a vida. Através dessa mulher, Anna realizou seu desejo de maternidade. Com uma espécie de devotamento místico, ocupou-se dos quatro filhos de Dorothy: Bob (Robert), Mabbie (Mary), Katrina (Tinky) e Michael (Mickey). Todos sofriam de distúrbios psíquicos mais ou menos graves e Anna lhes serviu de mãe, educadora e analista. 
Para eles, criou com Erik Erikson, Peter Blos e Eva Rosenfekd (1892-1977), sobrinha de Yvette Guilbert, uma escola especial.
Em 1922 Anna Freud apresentou um trabalho à Sociedade Psicanalítica de Viena e se tornou uma sócia da Sociedade. 
Em 1923 ela começou a praticar uma clínica psicanalítica com adultos e depois com as crianças e após dois anos estava ensinando em um seminário no Instituto de Treinamento Psicanalítico de Viena na técnica de análise de criança. 
Em 1923 Sigmund Freud começou a sofrer de câncer e ficou crescentemente dependente no cuidado de Anna. 
De 1927 a 1934 Anna Freud era a Secretária Geral da Associação Internacional de Psicanálise. Ela continuou a prática de análise em crianças e realizou e organizou seminários e conferências e, em casa, continuou ajudando no tratamento do seu pai. Ela também agiu como o representante público dele em várias ocasiões como a dedicação de uma placa no local de nascimento dele em Freiberg ou o prêmio Goethe em Frankfurt.
A fraqueza da doutrina annafreudiana vinha da ausência de reflexão sobre os laços do filho com a mãe. 
Aos olhos de Anna, só contava a relação com o pai. 
Depois da ruptura com Otto Rank, Anna Freud foi admitida em seu lugar no Comitê Secreto. Teve então a impressão de fazer parte, finalmente, dos paladinos da “causa” analítica, o que a aproximava ainda mais do pai. Assim, tornou-se a guardiã da ortodoxia freudiana.
Em 1935 Anna se tornou diretora do Instituto de Treinamento Psicanalítico de Viena. Em 1937, graças ao dinheiro de uma rica americana Edith Jackson (1895-1977), que foi a Viena analisar-se com Freud, Anna criou um pensionato para crianças pobres, ao qual deu o nome de Jackson Nursery. 
Mas em 1938 de março, o berçário teve que ser fechado dentro de alguns meses, pois a Áustria foi invadida pelos Nazistas, e a família Freud teve que fugir, embora a saúde doente de Sigmund Freud.
O Ernest Jones e Princesa Marie Bonaparte proveram ajuda vital obtendo os documentos de emigração. Mas era a Anna acima de tudo que teve que lidar com a burocracia Nazista e organizar as viabilidades da emigração da família para Londres em 1938. Anna se estabeleceu depressa na sua nova casa. 
Emigrou acompanhada de muitos vienenses que se exilariam depois nos Estados Unidos. Os kleinianos sentiram esse desembarque da “legitimidade freudiana” como uma verdadeira intrusão. 
Depois da erupção de guerra Anna montou um Berçário e Creche de Guerra Hampstead, que proveu cuidado para mais de 80 crianças. 
Próxima das posições da “Ego Psychology”, Anna Freud retomava a noção de defesa para fazer dela o pivô de uma concepção de psicanálise centrada não mais no isso, mas na adaptação possível do eu à realidade. Daí a importância muito grande dada aos mecanismos de defesa, mais do que à defesa propriamente dita. A obra teve grande sucesso nos Estados Unidos e marcou o nascimento do annafreudismo, segunda grande corrente representada na International Psychoanalytical Association (IPA).
Em 1952, fundou a Hampstead Child Therapy Clinic, centro de terapia e pesquisas psicanalíticas, onde aplicou suas teorias em estreita colaboração com os pais das crianças atendiada.
Guardiã da herança freudiana, tratou não só da publicação das obras do pai e de seus arquivos, como também dos membros da família, principalmente os sobrinhos. 
Dos anos cinqüenta até o fim da vida dela, Anna Freud viajou regularmente para os Estados Unidos para dissertar, ensinar e visitar os amigos. Durante os anos setenta ela se preocupou com os problemas de trabalhar com crianças emocionalmente privadas e socialmente desvantajosas, e ela estudou divergências e demoras em desenvolvimento. Na Yale ela ensinou seminários em crime e a família: isto conduziu a uma colaboração transatlântica com Joseph Goldstein e Albert Solnit e publicou como “Além os Melhores Interesses da Criança” (1973).
Ela também começou a receber uma série longa de doutorados honorários, enquanto começando em 1950 com Clark University (onde o pai dela tinha dissertado em 1909) e terminando com Harvard em 1980. Em 1967 ela recebeu um OBE de Rainha Elizabeth II; em 1972, um ano depois do primeiro retorno para a sua cidade nativa desde a guerra. A Universidade de Viena lhe premiou com um doutorado médico honorário: o ano seguinte ela foi eleita como presidente honorário da Associação de Psychoanalytical Internacional. Uma série de publicações dos seus trabalhos começaram em 1968, o último dos oito volumes ocorreu em 1983, um ano depois da sua morte. Em um assunto comemorativo de O Diário Internacional de colaboradores de Psicanálise na Clínica de Hampstead ofereceram um tributo para ela, e a Clínica foi renomeada de Anna Freud Centre. Em 1986 a sua casa durante quarenta anos, como tinha desejado, foi transformada no Freud Museum.
Coberta de honras, mas incapaz de compreender a evolução do movimento psicanalítico, Anna Freud morreu em Londres em 1982 depois de enfrentar a tempestade provocada pelos adeptos da historiografia revisionista a respeito da publicação das cartas de Freud a Wilhelm Fliess.

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