segunda-feira, 1 de março de 2021

OLHA LÁ, CAMPEÃO!


ONGs pediram ajuda de Hamilton na luta por direitos humanos (Foto: Mercedes)

Em carta, ONGs de direitos humanos pedem que Hamilton boicote GP da Arábia Saudita.

50 organizações ligadas aos direitos humanos pediram a Lewis Hamilton que dê voz aos protestos contra as violações aos direitos humanos na Arábia Saudita. Em uma carta, as ONG deram motivos para que o piloto da Mercedes se manifeste.
Juliana Tesser, de São Paulo28/02/2021 

50 entidades ligadas aos direitos humanos pediram que Lewis Hamilton boicote o GP da Arábia Saudita de Fórmula 1, marcado para 5 de dezembro. 
As organizações pediram que, se não puder faltar, o britânico se manifeste contra as violações cometidas pelo reino saudita.
Nos últimos anos, a monarquia absolutista islâmica do rei Salman Bin Abdul Aziz Al-Saud tem usado o esporte para tentar passar ao mundo uma imagem de país em transformação.
É tudo parte do plano ‘Visão 2030’, uma iniciativa apresentada em 2016 pelo príncipe Mohammed Bin Salman para reduzir a dependência da Arábia Saudita do petróleo, diversificar a economia e desenvolver setores como saúde, educação, infraestrutura, recreação e turismo.

Hamilton atuou em defesa dos direitos civis ao longo da temporada da Fórmula 1 (Foto: AFP)

Famoso internacionalmente por violações e brutalidade, o reino usa o esporte para mostrar outra imagem ao mundo. O Rali Dakar, por exemplo, exibe belas paisagens sauditas. A Supercopa da Espanha de 2018 mostrou homens e mulheres dentro de um mesmo estádio de futebol, algo incomum na realidade local.
A presença dos esportes ocidentais no território saudita é alvo de muitas criticas por servirem como uma espécie de máquina de lavar. Ano passado, às vésperas do Rali Dakar, a ONG Repórteres Sem Fronteiras emitiu uma nota pedindo que os envolvidos na disputa não servissem de propaganda. 
A Anistia Internacional, por sua vez, tem feito denúncias de constantes violações e aumento da repressão enquanto o esporte é usado como ferramenta de propaganda.
Apesar dos protestos internacionais, a Fórmula 1 introduziu uma corrida na Arábia Saudita no calendário deste ano, o que resultou no pedido das ONGs a Hamilton.
Em uma longa carta aberta, as ONGs apontaram violações aos direitos das mulheres, denunciaram tortura e lembraram do caso do jornalista Jamal Khashoggi, assassinado no consulado saudita na Turquia. Semana passada, o governo dos Estados Unidos divulgou um informe produzido há dois anos onde a inteligência americana concluiu que o príncipe Bin Salman “aprovou a operação em Istambul, na Turquia, para capturar ou matar o jornalista saudita Jamal Khashoggi”, que era considerado “uma ameaça ao reino”.
Confira na íntegra a carta enviada a Hamilton:

“Caro Lewis Hamilton,
Parabéns por outra temporada de sucesso na Fórmula 1. Você não só venceu corrida após corrida, mas também liderou a Fórmula 1 em questões de diversidade e justiça. Louvamos sua dedicação em aumentar a conscientização sobre questões que são importantes para você e esperamos que você continue lutando na temporada 2021 da Fórmula 1. Como organizações profundamente preocupadas com os abusos aos direitos humanos cometidos pelo reino da Arábia Saudita, pedimos que você reconsidere sua participação na corrida que será realizada na Arábia Saudita em 2021. Se não for possível por causa de compromissos anteriores, pedimos que se manifeste nesta corrida.
Depois de receber uma carta do filho de uma vítima de tortura do Bahrein, você expressou que gostaria de entrar em contato com os líderes do Bahrein, mas isso não foi possível após você contrair coronavírus. Agradecemos sua dedicação aos direitos humanos, e achamos que a temporada 2021 da Fórmula 1 apresenta uma oportunidade de solidariedade com os defensores dos direitos humanos da Arábia Saudita. Pela primeira vez na história da Fórmula 1, a Arábia Saudita vai sediar uma corrida em 2021. Acreditamos que está corrida é um lugar chave para uma declaração sobre direitos humanos. Você disse em uma entrevista anterior que não sabia o suficiente sobre o histórico de direitos humanos do governo saudita, então, para ajudar a contextualizar, destacamos as principais questões que cercam os abusos flagrantes dos direitos humanos no Reino Saudita.
Detenção de Ativistas pelos Direitos das Mulheres: Os líderes sauditas prenderam ativistas dos direitos das mulheres por pedirem as mesmas reformas que o reino e MBS [Mohammed Bin Salman, o príncipe] anunciaram publicamente como avanços em apoio aos direitos das mulheres. Por exemplo, a ativista saudita Loujain Al-Hathloul foi presa na Arábia Saudita de maio de 2018 até fevereiro de 2021 em retribuição por sua campanha (bem sucedida) para garantir os direitos de as mulheres dirigirem no Reino. Depois da prisão dela, Loujain suportou afogamento, eletrochoque, espancamentos, agressão sexual e muito mais. Em 2019, ela foi libertada em troca de fazer um vídeo afirmando que não havia sido torturada. Ela recusou e permaneceu na prisão. O caso dela foi levado a um tribunal de terrorismo após quase três anos de prisão preventiva e Loujain foi condenada em 28 de dezembro de 2020 a cinco anos e oito meses de prisão. A libertação dela no início de 2021 foi condicional, pois ela ainda tem a liberdade vigiada e uma proibição de viagem de cinco anos, impedindo-a de deixar a Arábia Saudita. As Nações Unidas e mais de 40 Estados do Conselho de Segurança da ONU pediram a libertação dela, assim como a libertação de outras defensoras sauditas dos direitos das mulheres, muitas das quais ainda estão na prisão.
A Guerra do Iêmen: Os líderes da Arábia Saudita também estão travando uma guerra brutal no Iêmen, que está deixando quase 20 milhões de pessoas morrerem de fome na pior crise humanitária do planeta. Em 2015, o príncipe-herdeiro da Arábia Saudita começou a bombardear o Iêmen. A Arábia Saudita impôs, então, um bloqueio terrestre, aéreo e marítimo ao país, deixando o Iêmen para morrer de fome. Um relatório divulgado pela Save the Children em 2018 estimou que cerca de 85 mil crianças morreram de fome no Iêmen. Por causa do bloqueio e da guerra, o Iêmen enfrenta uma das maiores taxas de mortalidade de Covid no mundo. Um relatório recente da ONU indica que há 13,5 milhões de pessoas enfrentando altos níveis de insegurança alimentar, que aumentará para 16,2 [milhões] na primeira metade de 2021. A ONU classifica o Iêmen como a “pior crise humanitária do mundo”.
O assassinato brutal do jornalista Jamal Khashoggi: Em outubro de 2018, agentes ordenados pelo governo saudita assassinaram brutalmente o jornalista do Washington Post Jamal Khashoggi. Khashoggi foi desmembrado com uma serra de osso enquanto ainda estava vivo no consulado saudita em Istambul. O assassinato deste jornalista dissidente gerou críticas em massa ao governo saudita. Os líderes sauditas tentaram encobrir esse assinado, mas, no fim, falharam. Uma investigação da especialista da ONU Agnes Callamard concluiu que o assassinato foi um “assassinato extrajudicial premeditado” que foi supervisionado, planejado e endossado por altos funcionários da Arábia Saudita.
Sr. Hamilton, nós acreditamos que existem muitas maneiras para que você manifeste uma posição nesta corrida. Usar sua plataforma pode ser tão simples quando tuitar a história de Loujain Al-Hathloul e pedir para que o governo saudita liberte Loujain [#FreeLoujain, no texto original] incondicionalmente, levantando o veto de viagem, permitindo que a família dela viaje e retirando as acusações. Além disso, a família de Loujain pedi que as pessoas que torturaram Loujain sejam responsabilizadas. Levando em conta que Loujain foi punida por dirigir, você poderia colocar um adesivo de Loujain no seu carro durante a corrida. Outra sugestão é que você use uma camiseta no dia da corrida pedindo que o governo saudita liberte Loujain e pare a guerra no Iêmen. Os organizadores desta carta ficaram felizes em fornecer qualquer material que você precise ou encontrá-lo para discutir ideias de ações e outras preocupações.
“Esperamos que você continue com sua brava luta na Fórmula 1 e fale sobre as violações de direitos humanos que acontecem em países onde você corre. A sua voz pode ser crucial neste momento para libertar defensores dos direitos humanos das mulheres na Arábia Saudita e acabar com o sofrimento de milhões de pessoas no Iêmen. Se você quiser conversar com a nossa coalizão, por favor, contate danaka@codepink.org”.

A carta é assinada pelas entidades: Action Corps, Alliance for Global Justice, ALQST for Human Rights, Americans for Democracy & Human Rights in Bahrain, Avaaz, Baptist Peace Fellowship of North America/Bautistas por la Paz, CAPA DePaul, Center for Democracy and Human Rights in Saudi Arabia, Chicago Area Peace Action, Chicago Committee Against War and Racism, CIVICUS: Global Alliance for Citizen Participation, Clearinghouse on Women’s Issues, CODEPINK, Democracy for the Arab World Now (DAWN), Equality Now, Fellowship of Reconciliation, Feminist Majority Foundation, Freedom Forward, Grassroots Global Justice Alliance, Green Party Peace Action, Indiana Center for Middle East Peace, International Service for Human Rights, Just Foreign Policy, London Students for Yemen, Martin Ennals Foundation, MENA Rights Group, Muslim Peace Fellowship, On Earth Peace, Peace Action, PEACEWORKERS, Project Blueprint, Rethinking Foreign Policy, RootsAction.org, Stop the War UK, Tunisian United Network, United for Peace and Justice,
University Network for Human Rights, Veterans For Peace, WESPAC Foundation Inc., West Suburban Peace Coalition, Western New York Peace Center, Women’s March Global, World BEYOND War, Yemen Relief and Reconstruction Foundation e Yemeni Alliance Committee.

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