Prefeitura que apoia festa religiosa não fere laicidade do estado, diz TJ-RS25 de outubro de 2020, 13h42.
Por Jomar Martins/CONJUR.
Município que apoia evento artístico de interesse da coletividade, embora com apelo religioso, não viola a laicidade do estado. Afinal, o inciso I do artigo 19 da Constituição proíbe união, estados e municípios de estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencionando-os ou mantendo relações de dependência ou aliança.
Vista aérea de Imbé, no litoral norte do RS.
Com este entendimento, a 21ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul confirmou sentença que julgou improcedente ação civil pública (ACP) ajuizada pela Associação Brasileira de Ateus e Agnósticos (Atea) contra o município de Imbé, no litoral norte gaúcho.
A ação visava impedir que a municipalidade prestasse qualquer subvenção ao "Acampamento de Verão com Jesus", ocorrido nos dias 15, 16 e 17 de fevereiro de 2019, sob pena de pagar multa diária.
O acórdão, com entendimento unânime, foi lavrado na sessão telepresencial do dia 8 de outubro.
Sentença improcedente
Na primeira instância da Justiça gaúcha, a 3ª Vara Cível da comarca de Tramandaí julgou improcedentes os pedidos vertidos na ACP, por não verificar afronta ao princípio da laicidade, que prega a desagregação da religião e seus valores sobre os atos governamentais.
Apesar de a parte ré ter auxiliado no apoio, organização e financiamento do evento religioso, o juízo entendeu que não houve violação do artigo 19 da Constituição.
A juíza Milene Koerig Gessinger disse que não se pode confundir apoio à realização de evento de interesse público com a conduta vedada no dispositivo constitucional, ainda mais quando os autos não trazem nenhum elemento que aponte para o uso indevido do dinheiro público.
Esforço para atrair turistas
Em complemento à fundamentação da sentença, o relator da apelação no TJ-RS, desembargador Armínio José Abreu Lima da Rosa, destacou que a contratação de dois cantores de música gospel de renome nacional mostra que a intenção do Município de Imbé era atrair turistas na alta temporada de verão.
E este acesso de público, como se sabe, fomenta a atividade hoteleira, restaurantes e o comércio em geral.
"Basta a leitura da programação do evento 'Acampamento de Verão com Jesus' para ser possível verificar que, embora presente a temática religiosa, se trata de festividade com evidente cunho turístico, cultural, artístico e recreativo, com a realização de diversas atividades, como teatro e mateada [consumo de chimarrão, hábito típico do gaúcho], além da realização de diversos shows musicais"’, anotou no voto.
Colaboração de interesse público
Ao término da leitura do seu voto, o desembargador-relator citou o desfecho da ACP 0328463-07.2019.8.19.0001 no Supremo Tribunal Federal, também manejada pela Atea, contra a apresentação da cantora Anaylle Sullivan e do padre Marco Lázaro no Réveillon 2020 do Rio de Janeiro.
Para o ministro Dias Toffoli, "é fato público e notório que foram contratados para se apresentarem no evento diversos profissionais, de variadas expressões artísticas e culturais apreciadas no país, não se admitindo que a categorização em determinado estilo musical seja usada como fator de discriminação para fins de exclusão de participação em espetáculo que se pretende plural". Assim, ele deferiu a tutela de urgência para suspender os efeitos da decisão cautelar obtida pela Atea junto à Justiça fluminense.
"‘Em suma, um Estado Laico não nega a existência de diversas religiões, sem professar nenhuma delas, nem obsta a verificação de eventuais relações pontuais com qualquer uma, visando à colaboração de interesse público, tal como ocorreu na hipótese em apreço [caso de Imbé], situação ressalvada no artigo 19, I, in fine, Constituição Federal"’, complementou o desembargador Armínio.
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9000242-52.2019.8.21.0073 (Comarca de Tramandaí)
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