terça-feira, 22 de janeiro de 2013

O PRIMEIRO ARTIGO DE ORLANDO PINHEIRO EM 2.013.


"Este é o primeiro artigo que escrevo no raiar de 2013. Gostaria de colocar nele algumas gotas de otimismo e outras pinceladas de esperança, de que tudo vai mudar neste ano, embora a pancadaria já tenha rompido na praça um 2013 violento para uma cidade pacata. Queria mudar alguma coisa nem que fosse daqui para ali. Mas mudança mesmo, tem que acontecer na minha cidade e no mundo também para o ano ser bom. Pessoalmente, quero preencher uma página por dia de bem viver com bom humor e andar pela vida sem pensar no amanhã, sem precisar contar nos dedos o dinheiro que não deu até o fim do mês. Triste sina dos brasileiros é essa. Aprender morder com os dentes para mastigar com a gengiva, como diz meu irmão. Nada de meta para cumprir, seja na área que for: espiritual, social, pessoal, profissional. Quero ver se no ocaso, no entardecer dos meus anos, ainda haja tempo para encontrar a receita do bem viver.

Por falar em ano novo, como foi seu Réveillon? Você mantém ainda viva algumas das antigas superstições nestes tempos de alta tecnologia? Comeu lentilhas? Aqueles grãozinhos verdes que crescem e você imagina que crescerá com eles. Só por curiosidade, diz-se que a lentilha foi o primeiro cereal cultivado pelo homem. Os irmãos bíblicos Esaú e Jacó tiveram uma pendenga de herança por causa de um prato de sopa da dita cuja. Colocou folha de louro na carteira para atrair dinheiro? Mandou ver pra goela três bagos de uva e fez um pedido especial? Em São Miguel Arcanjo, tem que ser uva - Itália... Quebrou o cofrinho das crianças só para jogar as moedinhas de fora para dentro de casa? Ou só deu três pulinhos com o pé direito segurando uma taça de champanhe na tentativa de não derramar uma gotinha sequer e, em seguida, jogou a bebida por cima do ombro para apagar de vez as tristes lembranças do passado? Eu sou do tempo em que se colocava nota alta de dinheiro dentro do sapato. E no raiar do dia primeiro, você abriu as portas e janelas de sua casa e acendeu todas as luzes? Muitas vezes a gente fica entretida com essas coisas mágicas e se esquece abrir a janela da alma e escancarar a porta do coração. Vestiu-se de branco outra vez, usou uma cueca velha e a patroa uma calcinha branca? Fez o primeiro negócio do ano sem pedir fiado? Nem comeu peru ou caranguejo na ceia porque são bichos que ciscam e andam para trás, levando nossa sorte junto? Perigoso mesmo está o bicho homem. Cada vez mais violento. As noites da minha cidade não são mais as mesmas. E pensar que nós, seresteiros inveterados, noitibós das madrugadas temíamos a viatura da polícia, a qual poderia nos surpreender à qualquer instante, nos levar para o xilindró por perturbação de ordem pública e vadiagem, com viola e tudo. Acho que eles não soletravam bem a diferença entre seresteiros e baderneiros. 

Seria muito bom que todo brasileiro, do rico ao pobre; da cidade grande ao menor arraial, soubesse que o que sobra neste país são crendices e superstições incapazes de alavancar a nossa triste história. Fora isso, no dia as magias são inócuas contra o antro de corrupção que se instalou de norte à sul, fora a violência e rebeldia que vem disseminando como erva daninha. Entra ano, sai ano, a sem-vergonhice aumenta. É triste observar um povo atrelado em mitos prosaicos, tentando se livrar com eles da servidão escravagista de um salário minguado, acreditando ainda que pular sete ondas na praia e oferecer prendas para Ogum e Iemanjá consegue a volta de um grande amor. Se o amor fosse grande não ia embora; e se foi embora é porque nenhum dos dois amava tanto. Logo, não era amor. Superstição ou não, existe aquela de você beijar sua amada para ser amado o ano todo. Nossa! Como os amantes se beijam no dia 31 e depois se cospem no ano inteiro. O amor verdadeiro em sua autenticidade não requer muito rapapé. Ele por si só torna a vida melhor de ser vivida.
E o mundo não acabou! Chegamos em 2013 com a mesma carga emocional, além da tributária, é claro, que adquirimos não só no ano passado, mas ao longo da existência. Importante mesmo é termos força para carregá-la. O mundo não acabou, mas algumas previsões procedem como a continuidade do modelo político e social em que vivemos neste país. A soberania da arrogância dos senhores do poder que sapateiam sobre a Carta Magna, julgando não só estarem acima da lei, como acima de qualquer suspeita. Videntes ainda estão consultando os búzios, bolas de cristais e cartas de tarô. Outros vendem o evangelho de Cristo em carnês... Estamos como dizia o mestre Chico Buarque: “levando pedras feito penitentes e erguendo estranhas catedrais”.
Poderíamos pensar diferente. Além de rir das crendices que se perdem no mundo dos I-pad, I-pod, aposentando o aipim, deveríamos ter a consciência de que 2013 está em nossas mãos. Temos um ano inteiro para moldá-lo como quisermos, mas não para esmurrá-lo em praças e botequins. Está nas mãos calejadas do sãomiguelense a mudança estrutural do município que inaugura o novo ano, sob nova gestão. Basta só recarregarmos nossas pilhas para a construção de um futuro melhor já que renovamos a esperança. Para conquistarmos o chamado “ano bom”, temos de dispor de talento, trabalho intenso e perseverança, muito mais que sorte.
Como estou ficando velho, decidi que o primeiro artigo do ano não seria de otimismo, mas de realismo. Não depende de sorte ou acaso para se viver plenamente bem. A única receita para mudar de vida é mudar-se a si mesmo. Não sei se é mania ou alguma síndrome desconhecida, mas à cada final de ano eu passo um filme da minha vida pela lente dos meus olhos cansados. Em 2012 tive a feliz oportunidade de ser vovô pela primeira vez. A emoção foi tanto que acabei não escrevendo nenhum verso sobre o primeiro chorinho da minha neta, justo eu que gosto de compor choro, em música, claro. Já compus um choro para minha filha Carolina, outro quando meu filho Marcelo nasceu. Pouco antes de Marina, minha neta nascer, depois de muitos anos sem compor, escrevi “Sonata para Marina”. Isso me fez bem. Rejuvenesceu meu coração cansado. Só por isso, 2012 foi um ano bom para os meus. 
...Problemas? Muitos... Quem nãos os têm? Entra ano, sai ano a história continua. A vida é como uma colcha de retalhos feita de momentos em momentos. A gente tem que ser determinado naquilo que faz, sem se esquecer da integridade humana para a vida fluir como um rio. Cada um de nós, à cada ano que passa, traz o coração marcado em sua trajetória de vitórias, provações, perdas, mas sabe que nada impedirá o dia seguinte. A renovação é constante. Por isso, meu amigo. Deixe de crendices. Acredite em você mesmo e no maravilhoso dom da vida que Deus lhe deu e seja feliz em 2013. Vamos trabalhar para que todo mundo tenha paz, pelo menos para dormir sossegado no fim de semana nesta cidade".

Texto de Orlando Pinheiro.
Transcrito do facebook.

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