Congresso derruba veto de Bolsonaro e hospital terá de notificar suspeita de violência doméstica.
Proposta destaca que a informação deve ocorrer em, no máximo, 24 horas.
Redação, O Estado de S.Paulo
BRASÍLIA - O Congresso Nacional derrubou nesta quarta-feira, 27, uma série de vetos da gestão Jair Bolsonaro a questões que envolvem violência domésticas.
Passa a ser lei, por exemplo, o projeto que obriga os serviços de saúde públicos e privados a notificar a delegacia policial mais próxima os casos com indícios de violência contra a mulher.
De autoria da deputada Renata Abreu (Pode-SP), essa proposta destaca que a informação deve ocorrer em, no máximo, 24 horas.
A justificativa do governo era de que “a notificação ocorreria sem o consentimento da vítima” e poderia provocar futuras retaliações do agressor.
Grupo faz ato contra a violência contra as mulheres no vão livre do Museu de Arte de São Paulo (Masp), na Avenida Paulista, na região central de São Paulo Foto: Rafael Arbex/Estadão
Ainda sobre o mesmo tema, passa a vigorar a lei que garante às vítimas de violência doméstica e familiar assistência judiciária para pedido de divórcio.
Também se torna lei um projeto que reserva pelo menos 30% dos recursos do Programa de Fomento à Pesquisa da Saúde para o desenvolvimento de medicamentos, vacinas e terapias para doenças raras ou negligenciadas pela indústria farmacêutica. O governo considerava que a proposta poderia “comprometer o fundo e o financiamento e pagamento de projetos e pesquisas que estão em andamento”.
Especialistas divergem sobre proposta
O Estado consultou duas especialistas sobre a proposta da notificação obrigatoriedade e elas divergem sobre o assunto. Para a advogada criminalista e ex-procuradora Luiza Nagib Eluf, o veto do presidente Jair Bolsonaro havia sido "um erro incompreensível e injustificável". Na visão dela, a lei contribui para o combate à violência contra a mulher, uma vez que poderia melhorar a qualidade das estatísticas, consequentemente, as políticas públicas voltadas ao tema.
"Historicamente, os casos de violência de gênero são subnotificados, esses registros seriam importantes para se avaliar a profundidade da tragédia no Brasil", diz. "Como vamos conseguir formular estratégias de governo ou tomar medidas sem dados ter acesso a dados adequados?"
Para Luiza, a comunicação obrigatória de casos suspeitos não significaria mais riscos à vítima. "Apenas estaria mostrando números. Ninguém vai publicar o nome, RG ou endereço da vítima e nem processar o suposto agressor", afirma. "Todo tipo de doença hoje já é notificada pelos hospitais: dengue, zika, sarampo, aids... Por que não pode notificar espancamento?"
Já a promotora Silvia Chakian, do Grupo de Enfrentamento a Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher, do Ministério Público de São Paulo, afirma que "neste momento" o veto havia sido "positivo". Para ela, antes de tornar obrigatória a notificação de casos suspeitos, é necessário debater melhor quais seriam os possíveis efeitos colaterais.
"Há preocupação grande de que as mulheres acabem não procurando mais o sistema de saúde, com medo de que isso vá parar na delegacia", diz. Nesses casos, segundo ela, não só a mulher deixaria de receber atendimento como também aumentaria as taxas de subnotificação de violência de gênero, que historicamente já são altas.
"Todos devem debater melhor o assunto e buscar estratégias que não provoquem desestímulo, aumento de subnotificação e revitimização", afirma.
Na interpretação da promotora, a lei não dava, ainda, garantia de sigilo à vítima.
ESTADÃO.
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