domingo, 26 de maio de 2013

HISTÓRIA REAL: A VOLTA DOS PRACINHAS BRASILEIROS


Quando a guerra terminou, os soldados brasileiros foram aclamados heróis 
pela população das pequenas cidades italianas que ajudaram a libertar dos 
alemães, no final da guerra. Para os italianos, os brasileiros eram os libertadores, 
sendo disputados pelas moças e pelas famílias onde passavam, todos querendo 
cumprimentá-los e convidá-los para mangiare ou beber um bom vino.
Depois das dificuldades enfrentadas, ser aclamado como herói, mesmo 
que por uma pequena população de algumas cidades, representou muito para o s
oldado brasileiro, homens que haviam sido convocados e enviados para uma 
terra distante, sem condições materiais nenhuma. Foram praticamente com a 
roupa do corpo, e ainda enfrentaram pressões como a descrença de seu próprio p
aís e a incredulidade de soldados de outros países quando contavam que eram 
de um país onde existia uma ditadura e que estavam lutando pela democracia. 
Mesmo assim, cientes de que pouco representavam para um conflito mundial, 
tiveram grande importância no âmbito que lutaram. 
Com o fim da guerra confirmado, antes de receberem alguma notícia 
sobre a volta, a maioria dos brasileiros aproveitou para realizar a última “tocha”
para conhecer a Itália e regiões da Europa. Viajavam “a base do dedo”, pegando 
caronas e indo de um lugar a outro. A maioria quando voltou já recebeu a notícia 
de que os brasileiros estavam acampados no sul da Itália aguardando o 
embarque para o Brasil. 
“Nossa bagagem constava de uma escova de dentes, 
alguns maços de cigarros e pacotes de liras, nada mais. O resto era coragem e 
muita vontade de conhecer <la bella Itália>.” “Assim é que, já nos primeiros 
dias de maio de 1945, a farda verde-azeitona era vista, com surpresa, nos 
extremos da Itália ou mesmo além: a 8 de maio, por exemplo, dia da vitória na 
Europa, soldados brasileiros se encontravam “a passeio’, (...), em Veneza, em 
Genova, em Nice, na França e mesmo no casino de Monte Carlo!”
A região onde os brasileiros ficaram acampados para aguardar a volta 
ficava à 50Km da cidade de Nápoles e era a mais quente da Itália. 
“Passara a 
primavera e a soalheira inclemente do verão veio em breve castigar toda aquela 
região. Com os dias, o trânsito intenso pelas ruas do acampamento produziu uma 
poeira impalpável, que a mínima aragem levantava em nuvem sufocante.” 
Neste acampamento, os homens se viram novamente por semanas na 
ociosidade e na ansiedade para voltar para casa, retornar ao lar e rever a família. 
A viagem de volta foi realizada por três navios norte-americanos e três 
navios brasileiros, em várias etapas. As descrições sobre a viagem de volta são 
muito diferentes da viagem de ida. Não havia mais o perigo de torpedeamentos 
ou ataques aéreos, não importava mais o conforto ou a comida. Só um 
pensamento assolava os homens, voltar para casa. Realmente, as descrições 
pouco falam das instalações do navio ou da comida, já haviam cumprido sua m
issão e a única coisa que queriam era retornar à sua terra querida. 
À bordo dos navios, os homens voltaram conversando, lembrando de 
alguns momentos vividos e recordando dos companheiros que infelizmente não 
puderam retornar com eles. “Não havia mais blackout, nem zigue-zague, nem 
submarinos, espreitando-nos. Os soldados passavam o dia todo sonhando de 
casa, com os seus”.
No Brasil, o comandante do Estado Maior já havia ordenado a 
desmobilização da FEB, os homens poderiam usar o uniforme até oito dias depois 
que chegassem ao Brasil, não mais. Depois, veio a proibição de formação de 
grupos de veteranos e até mesmo comentários e leituras sobre a campanha. O 
governo temia algum tipo de organização, já que os homens que lutaram na Itália, 
depois de vencerem pela democracia, estavam mais conscientes da situação 
política no país. 
“... a ditadura nunca resistiria ao paradoxo de fazer a guerra lá 
fora, em nome dos princípios democráticos e, aqui dentro, ignorá-los ou 
espezinhá-los.” 
Chegando no Rio de Janeiro, os soldados foram recepcionados com muita 
festa. Havia comemoração em todo o Brasil, os homens mal conseguiram desfilar 
devido ao assédio do povo, todos queriam fazer perguntas e chegar perto dos 
homens que voltavam da guerra. Os homens encontravam-se felizes por estarem 
de volta e ainda um pouco transtornados com a situação. 
Bóris Schnaiderman e Leonercio Soares lembram de toda a indiferença 
que o governo demonstrou com os homens recém chegados. Schnaiderman 
lembra que retornaram ao quartel, e quem morava no Rio de Janeiro foi para 
casa. Aqueles que moravam em outros estados e no interior tiveram que aguardar 
no quartel até sair o soldo para poderem ir para casa. No quartel precisavam 
escolher rapidamente se queriam engajar ou serem desmobilizados. A maioria 
dos homens não era militar e só queria voltar para casa e, como era o esperado, 
a grande maioria escolheu a desmobilização. Ainda haviam os boatos e 
promessas do governo de que aqueles que lutaram teriam emprego garantido em 
órgãos públicos, o que nunca aconteceu. 
No dia de receberem o soldo de guerra, mais uma surpresa, recebiam 
descontos por todos os materiais que acabaram perdendo na guerra. Uma 
ousadia de um governo, que mandou seus homens com uns míseros uniformes 
de segunda linha, cobrar por um capacete ou cantil perdido. Mas ninguém 
reclamou, todos só queriam ir para casa o mais rápido possível. E foi o que 
aconteceu; um dia pracinha e no seguinte, um simples civil. 
Os ex-combatentes não receberam nenhum tipo de auxílio governamental. 
Nenhum tipo de exame físico, principalmente mental, foi feito nos homens que 
voltaram. 
Quando a FEB foi desmobilizada, até mesmo os soldados que estavam 
nos hospitais receberam baixa do jeito que estavam e não ganharam nem a 
passagem de volta para casa.
Outra injustiça, lembrada por Leonércio Soares, foi sobre as promoções. 
Os oficiais, mesmo os que nem chegaram perto do front e os que não 
continuaram no exército, tiveram suas promoções garantidas e foram promovidos a
 dois ou três postos superiores. As promoções de praças, os que mais se 
expuseram e trabalharam na guerra, foram raras. Receberam condecorações e 
medalhas por seus méritos mas nenhuma promoção. 
“ Quem foi soldado, voltou 
soldado; quem foi cabo, voltou cabo; quem foi sargento, voltou sargento. E assim 
foram transferidos para a reserva.” 
Algum tempo após a desmobilização, muitos ex-combatentes, com 
problemas de readaptação ou mesmo financeiro, cairam na mendicância ou 
morreram como indigentes. Era comum achar em jornais da época notícias sobre 
a morte de algum indigente que trazia consigo objetos que o identificavam como 
um ex-pracinha.
Estes últimos fatos principalmente, levam a constatação sobre a 
participação do Brasil na Segunda Guerra Mundial como um resultado de acordos 
políticos e econômicos entre os EUA e Brasil. O contexto histórico político que se 
apresentou de fundo, ilustrado pelas relações Brasil- Estados Unidos, demonstrou 
que a participação dos brasileiros na Segunda Guerra Mundial aconteceu para 
atender aos interesses políticos e econômicos de ambos os países. 
Os Estados 
Unidos precisavam das matérias primas brasileiras e temiam que o governo 
brasileiro pudesse tornar-se integrante do eixo, o que acabaria influenciando 
também outros países da América do Sul, representando uma ameaça.
O Brasil, por sua vez, em vias de começar a investir em indústrias, 
precisava de capital estrangeiro e, aproveitando este ensejo, os EUA iniciaram 
uma aproximação com os países sul-americanos e principalmente o Brasil. 
O envio de homens à guerra foi uma garantia de que o Brasil realmente se 
encontrava ao lado dos aliados, principalmente porque fariam parte do exército 
norte-americano. 
O governo brasileiro comprometeu-se com os EUA a enviar homens para a 
guerra, mesmo sabendo como seria difícil a mobilização de uma Força 
Expedicionária. Os responsáveis pela mobilização e organização dos homens que 
iriam para a guerra conheciam exatamente as condições precárias do exército 
brasileiro então existente, prova disso é que muitos oficiais do alto comando se 
recusaram a fazer parte da FEB, temendo suas carreiras no caso de um fracasso. 
E era um fracasso que todos esperavam, alguns duvidavam até que a FEB 
chegasse a ir para a guerra. Mesmo assim, a Força Expedicionária Brasileira foi 
formada, com o mínimo rigor de seleção e enviada à Itália para lutar na Segunda 
Guerra Mundial. Ao longo da campanha militar brasileira, à medida que os 
soldados deparavam-se com as dificuldades, começaram a sentir a indiferença, 
principalmente da parte do governo brasileiro e dos responsáveis por sua 
organização. 
Foram estas dificuldades, enfrentadas pelos soldados brasileiros, que 
deram margem à uma construção de heroísmos frente aos inimigos. 
Percebe-se, segundo os pesquisados, que as dificuldades representaram 
um diferencial, criando entre os combatentes um sentimento e discurso próprio, 
aferindo grande importância à sua participação. Todos os exércitos que lutaram 
na Segunda Guerra mundial costumam ser lembrados e merecedores de honras, 
mas o exército brasileiro, justamente por sua insignificância em relação ao 
andamento geral da guerra, precisou, de certa forma, uma justificativa para 
engrandecer sua importância como digna dos mesmos méritos e honras. Esse 
discurso destaca as falhas de organização que, de fato, acarretaram inúmeras 
consequências no decorrer da guerra, dando ao soldado brasileiro, devido as 
situações enfrentadas e ao contexto histórico brasileiro ao qual o envio de 
homens à guerra aconteceu, a condição de herói. 

Conclusão da monografia de Karine dos Santos: "Os Bastidores das Batalhas: O Cotidiano; Os Pracinhas Brasileiros na Segunda Guerra Mundial".
Apresentada à disciplina Estágio Supervisionado em história, como requisito à conclusão do curso de história, Setor de Humanas, Letras e Artes da Universidade Federal do Paraná, sob a orientação do Professor Antônio César de Almeida Santos.
Curitiba/2.004.

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